São Paulo, Sexta-feira, 10 de Dezembro de 1999


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LITERATURA
Escritor alemão, autor do clássico "O Tambor", recebe hoje Prêmio Nobel
Gunter Grass vai à Suécia buscar o Nobel


CYNARA MENEZES
especial para a Folha

Quando o alemão Günter Grass receber hoje dos reis da Suécia o seu Nobel de Literatura, estará confirmando uma tendência: a volta do prêmio às suas raízes "idealistas", com um não assumido toque de esquerdismo.
Há dois indícios claros disso. Primeiro, Grass tem suas origens no socialismo e mantém viva a verve de polemista criticando os rumos neoliberais da Alemanha pós-reunificação; segundo, porque sucede a um socialista convicto, o português José Saramago.
Em seus primórdios, os acadêmicos do Nobel de Literatura, embora sempre garantissem não haver critérios políticos em sua escolha, tinham como premissa indicar um escritor não somente pelos seus méritos literários, como também pelo "idealismo".
Não foi por acaso que Carl David af Wirsén, o primeiro-secretário da Academia entre 1900 e 1912, recebeu a alcunha de "o Dom Quixote do idealismo romântico sueco". Fato que torna ainda mais curiosa a nomeação de Grass.
Em seu discurso à Academia, na terça-feira, Grass citou o personagem de Miguel de Cervantes, falando da influência árabe-mourisca em sua literatura. "Nela, a luta contra os moinhos-de-vento seguiu um modelo transmissível através dos séculos", disse.
Também Albert Camus, o Nobel de 57, parecia ter certa inclinação quixotesca: diz-se que levava frequentemente o livro de Cervantes debaixo do braço, inclusive quando veio ao Brasil, em 49.
Quando esse idealismo foi convertido em "humanismo", na década de 30, a nomeação para o Nobel de Literatura passou a ser dividida entre a boa escrita, as "boas ações" políticas, não necessariamente de esquerda, e a "descoberta" de desconhecidos, como o búlgaro Elias Canetti (81).
Ataques ao totalitarismo por meio do Nobel de Literatura sempre houve. Depois da fracassada tentativa de nomear Boris Pasternak em 58, o dissidente soviético Alexander Solzhenitsyn acabou levando o Nobel, em 70.
Solzhenitsyn estava proibido de deixar o país e o discurso do secretário da Academia naquele ano fez uma irônica referência à importância dos passaportes na formação do indivíduo.
Após a polêmica nomeação do primeiro-ministro inglês Winston Churchill em 53 por seus méritos "como orador e historiador" houve outra mudança nos critérios: escritores que tivessem cargos políticos estavam excluídos.
A inclinação mais esquerdista do que literária do Nobel deixou de fora nomes como Jorge Luis Borges e Ezra Pound, banido porque teria aderido ao Holocausto.


Hoje, excepcionalemente, não é publicada a coluna "Netvox"

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