São Paulo, quinta, 10 de dezembro de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

DISCO - CRÍTICA
Melancolia domina novo Roberto Carlos

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Reportagem Local

A não ser por razões de inércia, "Roberto Carlos" (o 42º disco do mesmo) chega como o menos esperado do ano. Todo aquele iê-iê-iê que há milênios se repete anualmente já virou "antimarketing".
Na canção de abertura, Roberto radicaliza -"Meu Menino Jesus", desbundada, é um tema natalino. O "Rei", pensa-se aí, já não produz em prol de arte ou de música , mas em prol do Natal mesmo.
O folclore que isso implica assassina qualquer possível ansiedade em torno de um novo "Roberto Carlos", tanto quanto torna cada vez menos plausível a insistência de sua gravadora em postá-lo na fabular cifra de 1 milhão de cópias vendidas por disco -e no Brasil, desgraçadamente, números como esse não são comprováveis, seja como falsos ou verdadeiros, já que o maior interessado (a gravadora) é seu detentor exclusivo.
Detalhes não tão pequenos deste "RC" dão a pista de que os números andam precisando de incremento. Na mesma proporção em que canta cada vez melhor, ele se torna mercadologicamente mais apelativo a cada dia. Isso vai à estratosfera no pagode "Vê se Volta pra Mim", uma redenção humilhante do "Rei" a um dos gêneros mais vulgares da música de massa dos 90, o tal "sambanejo".
O artista não precisava disso, é o que bate no coração. Bate mais ainda quando se percebe que a parcela "ao vivo" do CD (60% do todo) -ou seja, de produção rápida e fácil comercialização, por só englobar sucessos-chavão- é o que há nele de mais quente.
Aí há singelezas cantadas de forma melancólica e agora distanciada daqueles velhos cacoetes que Roberto havia muito ostentava em shows. "Debaixo dos Caracóis dos Seus Cabelos" (71) e "Nossa Canção" (66) já eram memoráveis, continuam sendo aqui.
O mesmo ocorre na instrumental "O Diamante Cor-de-Rosa" (69) -nem sequer creditada no CD-, que dá cama para um belo texto saudosista declamado por ele.
Até entre as (quatro) inéditas há sombras de criatividade. "O Baile da Fazenda", um forró, poderia ser tão apelativo quanto o resto, não fossem brutais doçura e tristeza com que é cantado e a nobre participação do sanfoneiro Dominguinhos -aqui o teimoso Roberto muda de prumo e lembra que existe, sim, uma coisa chamada MPB.
Mas, como todo ano ele faz tudo igual, possíveis lampejos ficam diluídos -especialmente nos arranjos aquém do qualificável, de autoria de Eduardo Lages.
Também auxilia a diluição a edição às pressas, que deixa passar no encarte atrocidades do tipo "está é a nossa canção" ou, na lista de agradecimentos, "à Deus" e "à Jesus". Oh, céus, Deus e Jesus não levam crase! Fica difícil crer num CD de um artista-standard dessa envergadura se até o revisor do encarte -ou seja, a gravadora- ficou com preguiça.
Ele está triste, sua mulher está doente, talvez não tivesse mesmo vontade de fazer esse disco. Não seria então o caso de não fazê-lo, guardar-se neste Natal e voltar mais forte daqui a um tempo?
Bem, Roberto é um senhor teimoso, todo mundo já sabe. Não merece menos respeito por isso, se ao menos não deixou, ainda, de aprimorar seu canto -e, sinal de que nem tudo está perdido, até abdicou dos tons azuis de sempre e fez uma capa verde. Quem sabe?...


Disco: Roberto Carlos Lançamento: Sony Quanto: R$ 18, em média




Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.