São Paulo, quinta, 10 de dezembro de 1998

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DAQUI A 40 ANOS

Leia o que oferece a Ilustrada de 2038

BERNARDO CARVALHO
especial para a Folha

Abre hoje, às 18h, a exposição "Quebrando o Código Perdido da Literatura" (Breaking the Literary Code), na seção arqueológica do Museu do Ipiranga. Segundo a curadora, Kidman Mousinho, 40, a exposição tem como objetivo (goal) dar uma idéia do que foi o gênero literário, "uma forma sem função, elitista, machista, racista e petulante", diz Kidman, que desapareceu por seleção natural na virada do século com a ajuda do marketing, da linguagem oral-visual (oral-visual language) e o advento da célebre escola da "verdadeira expressão" (veritable expression). Os autores dessa escola, relatando com coragem suas experiências de vida positivas e humanas ("Meus Dias com as Drogas e Depois", "Como Venci o Câncer pelo Amor Cibernético", "A Aventura de um Gaúcho na Amazônia" já são hoje marcos históricos), foram substituindo pouco a pouco os obsoletos devaneios literários. A exposição permite ao visitante iletrado (mesmo aquele que só lê inglês) decifrar sem maiores esforços parágrafos (inteiros! -até hoje a experiência havia sido realizada só com frases isoladas) de textos antigos e intricados (em português) por meio de um método de tradução em imagens desenvolvido especialmente para a ocasião.

Será lançado hoje, a partir das 20h, na agência cultural do Banco Digiwebweb, o livro "A Volta ao Mundo a Nado" (em linguagem oral-visual, com pequena tiragem especial e numerada em português arcaico, para colecionadores), em que o apresentador de TV Bal Cunha lança mão, outra vez, de meios anacrônicos de locomoção e se despe das tecnologias para narrar sua experiência mística. Depois dos best sellers "A Subida do Morro Santo, Eu Vi", homenagem à melhor tradição das antigas letras brasileiras, e "A Revelação pelo Gelo", sobre a célebre expedição Goldenmastermaster (financiada pelo cartão de crédito), em que o apresentador relata com sua verve habitual a conquista do último desafio da natureza pelo homem (a travessia da Antártida sozinho, de tênis e com rádio amador), Cunha diz que seu novo livro é, "ao mesmo tempo, um protesto e uma ode ao planeta e ao futuro das crianças" (future of our kids). O apresentador faz referência à polêmica lista de escolhidos como potenciais habitantes da primeira estação orbital de atmosfera não-poluída, em que não foi incluído -não haverá brasileiros a bordo. Cunha é o convidado de amanhã do programa "Puxa!", com os bambas indefectíveis Seus Colegas de Mídia como entrevistadores. Canal 231, 20h.

O grupo Curadores Injustiçados dá hoje, às 20h, na Casa do Artista, a primeira palestra pública depois de sua volta do exílio. O grupo é formado por curadores de arte que foram levados a se exilar nos anos 10, depois de serem apedrejados e perseguidos como "fomentadores da imbecilidade humana e interesses escusos". Com a anistia, os curadores já podem trabalhar de novo no país. O tema da palestra (entrada grátis) é "A Necessidade Imprescindível e Essencial da Curadoria para o Futuro da Arte". Há ingressos disponíveis.

A banda Tomorrow Never Comes toca hoje, às 22h, no estúdio Original, com participação especial da atriz Césia Kubrick. O grupo integra o movimento retrógrado, que busca as raízes da música brasileira, contra a tendência de pasteurização universal. "A gente faz uma coisa mais autêntica, partindo do axé do século passado como forma de resistência cultural", diz Kubrick, Amália da novela "Ventre Amargo" (Bleak Womb), remake da versão de 2027, por sua vez um remake da versão-sucesso de 2015, baseada livremente na obra original de 2006.

É hoje, nas ruínas do Playcenter, a partir das 19h, o vernissage dos artistas Sid Maria, Camponato Braga, Suzy Impó e Carlos Apoplé, todos da geração de 30, que retomou a idéia do corpo como espaço consensual entre o espetáculo e a provocação, no embate com a matéria sensitiva urbana e a tessitura da experiência da identidade no campo da virtualidade lúdica, sem esquecer a importância do diálogo com a moda que impregna toda a arte desde os antigos contemporâneos. A exposição reúne as obras "Roda Gigante", "Trem Fantasma" e "Telma, a Mulher-Gorila" e instalações-interativas, retrabalhando o conceito de teia urbana.

Volta a funcionar a partir de hoje o Money = Culture, site de compras e entretenimento destruído há dois meses (two months) por um vírus-bomba. Os responsáveis, um grupo de septuagenários (septuagenaries), todos nascidos nos anos 60 do século passado, foram presos e respondem a processo. Segundo o promotor, os terroristas se recusam a explicar a ação. Tudo indica que sejam fanáticos integristas movidos por um ódio anti-social contra o bem-estar da maioria e das grandes corporações de cultura. Os terroristas dizem ter sido escritores, artistas e músicos no passado, embora ninguém tenha ouvido falar deles. Dos depoimentos de repúdio recolhidos pela promotoria, a reação da escritora Dana Sinsi, 60, autora da trilogia "Lush", "Such" e "Much", que começou como clubber na noite paulistana dos anos 90 do século 20, é ainda hoje a mais implacável: "Recalcados!" (Resentful!).

Chega ao Brasil amanhã, após ter sido revelado neste país com exclusividade por este caderno, o maior, mais inteligente, mais irônico, mais "cool" dos cineastas da nova safra independente americana, Garry Adrian (leia entrevista exclusiva na página ao lado). O mais genial novo astro da cena internacional, que está mudando os rumos das imagens em todo o mundo, vem lançar seu mais recente filme, "Polemical". Este caderno viu o filme com exclusividade. É o melhor do cineasta desde "Shocking", que resenhamos primeiro, com exclusividade, há três anos (three years), quando ninguém tinha ouvido falar nele.



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