São Paulo, quarta-feira, 11 de janeiro de 2006

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CINEMA

Responsáveis pela programação e agenda do festival norte-americano chegam a assistir cerca de mil títulos por ano

Filmes de Sundance passam por "máquina" de seleção

JOHN CLARK
DO "NEW YORK TIMES"

Era novembro de 2005, e John Cooper estava em seu escritório em Beverly Hills, contemplando um quadro de avisos. Ao longo das semanas seguintes, o quadro, coberto de cartões organizados segundo um código de cores e portando o nome de filmes, ganharia forma definitiva como agenda de programação do Sundance Film Festival de 2006.
Mesmo nos estágios finais do processo, a programação ainda estava longe de definida. "Quando chegarmos à semana que vem, talvez metade desses títulos tenham sido excluídos", disse Cooper, diretor de programação, com ar de exaustão. Trabalhos que nem mesmo haviam entrado em consideração poderiam se tornar parte da lista. Mas ele sabia que, de um modo ou de outro, o total de cartões teria de ser reduzido a 120, a lista final de filmes, em tempo para a divulgação oficial.
Cooper não estava trabalhando sozinho, evidentemente. Ele conta com a colaboração de Geoffrey Gilmore, diretor do festival há 16 anos, e com uma equipe de três programadores, Trevor Groth, Shari Frilot e Caroline Libresco. Neste ano, organizadores tiveram de considerar uma lista de 1.004 longa-metragens norte-americanos e 936 internacionais, além de 760 documentários norte-americanos e 448 internacionais. Havia ainda os curta-metragens, 4.311 no total. Conseguir assistir a todos já representa uma façanha. Cooper conta que, no dia anterior, havia assistido a sete filmes. Groth está assistindo a 14 horas diárias de cinema, nos últimos dois meses. Gilmore diz que no curso de um ano costuma assistir a entre 800 e mil filmes.
O festival se tornou tão famoso que seu nome é sinônimo de cinema independente. Sob o comando de Gilmore, 54, Sundance, criado por Robert Redford, virou uma instituição internacional.
"Suponho que afirmar que a integridade é parte essencial do sucesso do Sundance possa me fazer parecer pomposo", disse Gilmore. "Mas se nós não tivéssemos integridade, se não incluíssemos na programação os filmes em que acreditamos, e não aqueles que as pessoas tentam nos convencer a programar, nós não nos teríamos tornado o festival em que nos transformamos. Porque todo mundo está tentando nos influenciar, todo mundo pede um favorzinho, todo mundo tenta dizer que, caso não incluamos um determinado filme na programação, eles serão levados à falência."
As inscrições se encerram oficialmente em 30 de setembro, ainda que não seja incomum que se arrastem, informalmente, até o início de novembro. O festival acontece entre 19 e 29 de janeiro em Park City, Utah.
"Muita gente acredita que um bom programador seja uma pessoa de gosto estreito e refinado, alguém que ocupa uma espécie de pico de compreensão estética. Enquanto na minha opinião um bom programador é uma pessoa receptiva a muitas coisas diferentes", disse Gilmore.
O que conduz o processo é algo que Cooper gosta de designar como "a máquina". Todos os filmes são assistidos na íntegra por pelo menos uma pessoa, e freqüentemente mais.Gilmore diz que tenta explicar aos selecionadores como distinguir "o esquisito do ruim".
Gilmore diz que não procura por consenso, mas por dedicação apaixonada de seus programadores. Se um filme anima muito a algum deles, talvez mereça consideração mesmo que os demais integrantes da equipe discordem.
Os debates não se encerram com a seleção. Há também a questão da distribuição de filmes entre as diversas mostras que compõem o festival. As categorias ambicionadas são as mostras competitivas, que têm grande audiência. Ocasionalmente, um filme é excluído da competição porque a produção é grande demais.
Por exemplo, na categoria drama, "Friends with Money" [amigos com dinheiro], de Nicole Holofcener, que Gilmore descreveu como "um dos melhores filmes independentes", está sendo exibido como atração da noite de abertura, e não na mostra competitiva. Isso se deve ao fato de que Holofcener é uma cineasta conhecida, e o filme conta com estrelas como Jennifer Aniston.
Mais perto das notícias, o festival este ano se viu inundado de filmes sobre o Iraque. Os programadores escolheram um para a mostra internacional, "Short Life of José Antonio Gutierrez" [breve biografia de José Antonio Gutierrez]. Para contrabalançar os documentários sérios, eles selecionaram "Wordplay", de Patrick Creadon, sobre as palavras cruzadas do "New York Times" para a mostra competitiva.


Tradução Paulo Migliacci

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