|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Chega ao Masp exposição italiana dedicada à arquiteta que criou o museu paulista e influenciou a cultura brasileira
A lição moderna de Lina Bo Bardi
MARIO GIOIA
DA REPORTAGEM LOCAL
De volta às origens. O Masp
mostra a partir de hoje, para convidados, e de amanhã, para o público, 200 obras de sua criadora, a
ítalo-brasileira Lina Bo Bardi. Lina (1914-1992), autora de prédios-símbolo em São Paulo como o
Sesc Pompéia, o teatro Oficina, a
Casa de Vidro, além do próprio
museu, tem sua obra revisitada
por três curadores italianos -Luciano Semerani, Antonella Gallo e
Giovanni Marras-, que já haviam exibido a mostra "Lina Bo
Bardi -Arquiteto" na Bienal de
Arquitetura de Veneza de 2004.
O trio de curadores procurou
conferir novas perspectivas ao
trabalho da arquiteta, enfatizando
aspectos por vezes minimizados
em estudos nacionais sobre ela,
como projetos de urbanismo não-realizados e objetos-brinquedos
que retratam animais.
Os curadores não se furtaram
em enxergar a grande faceta lúdica do trabalho de Lina e montaram, pela primeira vez, a vaca mecânica que ela projetara em 1988.
Abrigando prateleiras de objetos
de arte popular, ex-votos e joguetes, ela muge em resposta à aproximação do público.
"A arquitetura de Lina pode ser
vista como uma mescla do brutalismo com o surrealismo", avaliou Semerani. A reunião livre
-como Lina em geral expunha- de objetos de formas diversas, com raiz orgânica, e mobiliário que foge das retas e se inspira
em modelos da natureza reforça a
idéia de Semerani.
Involução arquitetônica
"Lina não caberia no mundo de
hoje", argumenta o arquiteto André Vainer, um dos seus principais assistentes. "Não sei como ela
veria uma São Paulo onde há cada
vez mais segregação social, onde
ocorre uma "condominização" das
classes mais ricas e onde houve
uma involução arquitetônica."
O arquiteto considera um modismo atual das elites "consumir
o estilo moderno, assim como
houve o neocolonial dos anos 70 e
a onda neoclássica, que ainda
existe." Vainer relembra a "ética"
que Lina incutia nos assistentes.
"A palavra que ela mais usava
quando apresentávamos idéias
era "não". Ficávamos um pouco
contrariados. Depois, percebemos o quanto ela fazia isso para
nos provocar, nós que tínhamos
acabado de sair da USP. E não fazia concessões à mediocridade."
De acordo com o professor de
arquitetura da Universidade de
São Paulo (USP-São Carlos) Renato Anelli, a mostra estimula novas visões sobre a obra de Lina.
Anelli aponta o projeto de urbanização de Itamambuca, em Ubatuba (litoral norte de São Paulo), de
1965, como um desses achados.
Ele considera muito interessante
a "idéia de projetar lotes circulares, com áreas verdes comuns e
caminhos sinuosos".
Retomada
Com a mostra, o Masp retoma
uma série de elementos explorados por Lina em sua concepção de
museu, como as paredes de vidro
e a exibição de trabalhos em painéis de concreto e vidro.
"Acho que no Museu de Arte de
São Paulo eliminei o esnobismo
cultural tão querido pelos intelectuais (e os arquitetos de hoje), optando por soluções diretas, despidas. O concreto como sai das formas, o não acabado, pode chocar
toda uma categoria de pessoas. Os
painéis didáticos (...) nos quais
são expostos os quadros não agradam os acostumados ao comodismo dos estofados e dos controles
remotos", defendia a arquiteta,
antevendo polêmicas posteriores.
Os curadores italianos enfatizaram a volta dos cavaletes, junto
com as paredes envidraçadas, que
deixam a luz chegar ao espaço expositivo do subsolo do museu que
ela própria criou. Já em Veneza,
eles fizeram uma "releitura" dos
equipamentos, com obras dos
dois lados do painel de vidro.
"Uma das grandes lições de Lina é a afirmação de uma identidade arquitetônica. O painel de vidro é um dos elementos de tal
identidade. Esperamos que o museu se anime a utilizá-lo de novo
após a mostra", disse Semerani.
O presidente do Masp, Julio Neves, disse que a instituição não vê
problemas em sua utilização regular, mas em casos especiais.
"No caso dessa mostra, não há
problema algum em exibir projetos nos cavaletes", afirmou ele.
"Mas seu uso na pinacoteca deve
ser estudado. Os painéis também
têm número limitado. Mas em
2005 os usamos [na mostra "As
100 Maravilhas"]." O restaurante
e o ateliê também voltaram a ter
mais transparência, em consonância com o projeto de Lina.
Bahia
O escritor, poeta e antropólogo
Antonio Risério, 52, diz que Lina
"trazia uma pedagogia da inquietude". Ela foi uma das estrelas do
efervescente meio intelectual
baiano dos anos 50 e 60. Em Salvador também se instalaram o
maestro Hans Joachim Koellreutter, a coreógrafa e bailarina polonesa Yanka Rudzka e o filólogo
português Agostinho da Silva, entre outros.
Lina, que foi amiga do cineasta
Glauber Rocha, é responsável por
projetos importantes na cidade,
como a Casa de Benin. "Como
disse Caetano [Veloso], Lina foi
fundamental para nos civilizarmos", diz Risério. Certamente a
cidade de São Paulo também se
civiliza um pouco mais com a
mostra das lições modernas de Lina no Masp.
Lina Bo Bardi - Arquiteto
Quando: ter. a dom., das 11h às 18h
(bilheteria fecha às 17h). Abertura
amanhã (público). Até 19/2
Onde: Masp (av. Paulista, 1578, SP, tel.
0/xx/ 11/3251-5644)
Quanto: de R$ 5 a R$ 10
Texto Anterior: Teatro: Estão abertas as inscrições para o 13º "PoA em Cena" Próximo Texto: Frases Índice
|