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CINEMA
Com Natalie Portman, "Hora de Voltar" marca estréia de Zach Braff na direção
Comédia dramática vê juventude paralisada
BRUNO YUTAKA SAITO
DA REDAÇÃO
Há , em qualquer que seja o filme, a sensação primeira de
estranhamento, um mundo novo
em criação. Em "Hora de Voltar",
somos jogados, sem muitas explicações, referências ou créditos
iniciais, aos delírios de um rapaz
tão entorpecido quanto puramente abobalhado.
Na falta de pistas, vemos esse
ator frustrado que trabalha como
garçom em Los Angeles, Andrew
Largeman (Zach Braff), retornar à
sua terra natal, Nova Jersey, para
acompanhar o enterro da mãe.
É justamente a calma com que
as informações essenciais sobre
seu protagonista são distribuídas
ao longo de sua história o motor
do fascínio dessa pequena fábula,
que tem lá seus delírios de grandeza ao tentar registrar o estado
de espírito de uma jovem geração.
Braff, fazendo aqui também sua
estréia na direção, tenta transferir
para o espectador toda a tensão
da desorientação inerentes ao fim
da adolescência sem meias-palavras. Apenas mais à frente é que
saberemos o porquê da imobilidade de Largeman. Ele está sedado desde a infância, literalmente.
Devido a um acidente na tenra
idade, Largeman será a partir de
então diagnosticado como agressivo e terá sua real personalidade
camuflada sob um coquetel de
drogas medicadas pelo pai, lacônico psiquiatra. A morte da mãe e
a volta à cidade fazem essa criatura refém sair do controle: pela primeira vez, deixará de tomar seus
(desnecessários) remédios, ensaiando uma vida própria.
E a partir daqui ficam explícitas
as distâncias que separam esse
"Hora de Voltar" de "A Primeira
Noite de um Homem" (1967), sua
evidente fonte de inspiração. Não
estamos no território do mundo
novo que se rebela contra uma
realidade decrépita. Braff tem à
frente o viciado universo do cinema indie, das referências pop, dos
esquisitos; Godard e Truffaut são
mais verbetes de enciclopédia do
que o retrato das ruas.
Largeman concentra na sua figura todos os estereótipos que as
gerações mais velhas vêem nos
seus jovens. É uma tropa de garotos tolos, com pouco para dizer,
movidos por uma revolta contra
não se sabe o quê -cuja imbecilidade vê seu ápice em Columbine.
Não por acaso, um dos personagens não consegue lembrar o nome de Aldous Huxley e sua sociedade de pílulas da felicidade.
A ânsia por ser especial e, assim,
ser visto de alguma forma, para
validar a existência de uma vida
banal, vem cristalizada em Sam
(Natalie Portman), garota igualmente problemática -é mentirosa compulsiva e epilética- que
ajuda Largeman a sair da letargia.
De certa forma, esse grupo
-completado ainda pelos amigos coveiros e pelo milionário colega que fez fortuna ao criar um
"revolucionário" invento- viverá seus dias de "O Mágico de Oz";
há até um homem de lata no meio
do caminho. São personagens
que também buscarão desesperadamente retornar à casa, mas
aqui a idéia de família é uma abstração ainda maior, já que ela praticamente não existe. Braff vai
tentando encaixar esses seres outsiders em lacunas muito particulares, ele mesmo exalando os ares
da inexperiência juvenil -nem
tudo funciona no filme, e a guinada para um sentimentalismo
atroz na parte final quase interrompe a seqüência de boas idéias
criadas. Utopia, enfim.
Hora de Voltar
Garden State
Direção: Zach Braff
Produção: EUA, 2004
Com: Zach Braff, Natalie Portman
Quando: a partir de hoje no Frei Caneca
Unibanco Arteplex e HSBC Belas Artes
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