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FESTIVAL DE DOCUMENTÁRIOS
`Olhos Azuis' vira racismo de cabeça para baixo
JOSÉ GERALDO COUTO
especial para a Folha
``Olhos Azuis'' é um documentário frio sobre um tema fervente:
os workshops sobre racismo desenvolvidos pela norte-americana
Jane Elliott.
O filme acompanha, especificamente, um desses workshops, realizado em Kansas City com 30 pessoas, entre professores, policiais e
assistentes sociais.
Durante duas horas e meia esses
indivíduos são submetidos a um
estranho experimento: os que têm
olhos azuis são separados dos restantes e bombardeados por um
tratamento discriminatório e
ofensivo semelhante ao que os negros e outras etnias oprimidas sofrem cotidianamente nos EUA.
Durante a sessão, portanto, o
que ocorre é uma espécie de encenação condensada do racismo, em
que este aparece ao mesmo tempo
intensificado e virado de cabeça
para baixo.
Os homens e mulheres de olhos
escuros (sejam eles brancos, negros, orientais ou mestiços) são
orientados a participar ativamente
do tratamento de choque infligido
aos branquelos, o que inclui testes
pseudocientíficos de QI destinados a ``provar'' sua inferioridade.
Há um mérito inegável nesse tipo
de laboratório, que é o de trazer à
tona de modo implacável todas as
formas de discriminação presentes
no dia-a-dia, mesmo as mais sutis.
Mas há outros aspectos mais discutíveis no experimento. Sua comandante (este é o termo), Jane
Elliott, parece conduzi-lo com indisfarçável sentimento de vingança -e o que ela enseja aos participantes é uma espécie de catarse.
Os ``olhos azuis'' choram, confessam, sentem-se purgados da
culpa de ser racistas; os negros e
outras minorias sentem-se vingados por um breve momento.
É de se perguntar se a experiência, que lembra um pouco certas
técnicas teatrais de Augusto Boal,
não funciona como o Carnaval,
como uma válvula de escape para
as tensões e ressentimentos cotidianos -para que no dia seguinte
tudo volte a seus devidos lugares.
Mais preocupante ainda é ver
-em imagens antigas que o documentário recupera- o mesmo tipo de experiência ser imposta a
crianças de sete ou oito anos, com
pretextos educativos.
De todo modo, o documentário
aposta no caráter positivo do trabalho de Elliott (que desenvolve
esse tipo de workshop desde 1968),
ao mostrar antigos alunos seus que
hoje se apresentam como indivíduos sensíveis aos problemas do
racismo e da discriminação.
Polêmica à parte, uma coisa é
certa: ninguém fica indiferente
diante desse ``Olhos Azuis''.
Filme: Olhos Azuis
Produção: Alemanha/EUA, 1996
Direção: Bertram Verhaag
Quando: hoje, às 17h
Onde: no Cinesesc
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