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Crítica/DVD/"O Segundo Rosto"
Frankenheimer encerra "trilogia da paranoia" com olhar virtuoso
Misto de ficção científica e drama, filme aborda organização que oferece a homens ricos a possibilidade de mudar de vida
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
"O Segundo Rosto"
(1966), filme estranho e fascinante,
fecha a chamada "trilogia da
paranoia" de John Frankenheimer, da qual fazem parte também "Sob o Domínio do Mal"
(de 1962, refilmado em 2004
por Jonathan Demme) e "Sete
Dias em Maio" (1964).
Os três filmes são diferentes
nos temas e na ambientação,
mas unidos pela atmosfera de
alucinação, de ingresso em outra dimensão da realidade, graças a tramas extravagantes e a
uma abordagem estética não
convencional.
Misto de ficção científica e
drama existencial, o entrecho
de "O Segundo Rosto", inspirado em romance de David Ely,
fala de uma organização secreta que oferece a homens ricos a
possibilidade de mudar de vida.
A Companhia forja a morte do
sujeito e o faz "renascer" com
um novo nome, uma nova aparência, uma nova profissão.
Um dos contemplados com o
perigoso privilégio é Arthur
Hamilton (John Randolph),
executivo de banco de meia-idade que tem um bom patrimônio, um casamento morno e
um cotidiano medíocre.
Revelar mais do que isso seria correr o risco de estragar as
surpresas e reviravoltas da narrativa. Mas é preciso dizer que
o protagonista é Rock Hudson,
na pele de Tony Wilson, um
abonado artista plástico que
mora numa casa à beira-mar
em Malibu, na Califórnia.
Virtuosismo
A primeira meia hora é um
primor de narrativa audiovisual e de construção de atmosfera. Com poucos diálogos e
muito virtuosismo de câmera
("travellings" nervosos, foco
profundo alternado com grandes angulares que distorcem o
espaço etc.), acompanhamos o
ingresso de Arthur Hamilton
nas entranhas da Companhia e
seu vertiginoso mergulho (ou
queda?) num novo plano da
existência.
A fotografia em preto e branco, indicada ao Oscar, é do lendário James Wong Howe. Ela
ajuda a criar um espaço maleável e ameaçador, um terreno
incerto. Uma estação de trem,
uma tinturaria, um frigorífico,
tudo adquire aspecto de sonho
ou, antes, de pesadelo, mais ou
menos como fizera Orson Welles filmando Kafka uns anos
antes ("O Processo", 1962).
Depois desse início soberbo,
o filme tem algumas viradas espetaculares e uma discussão interessante sobre o tema da
identidade, mas ocasionalmente se afrouxa, por exemplo ao
alongar uma cerimônia do vinho que vira uma espécie de orgia hippie (tributo aos tempos).
O DVD inclui as imagens de nudez que foram suprimidas da fita exibida nos cinemas.
Frankenheimer, diretor
oriundo da TV, ainda demonstraria extraordinário domínio
técnico em filmes como "Grand
Prix" (1967), "Operação França
2" (1975) e "Ronin" (1998), mas,
de modo geral, se perderia em
produções rotineiras ou de encomenda, como o telefilme
"Amazônia em Chamas"
(1994), sobre Chico Mendes.
O SEGUNDO ROSTO
Lançamento: Lume
Quanto: R$ 49,90
Classificação: 10 anos
Avaliação: ótimo
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