São Paulo, quinta-feira, 11 de maio de 2000


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MÚSICA / MARISA MONTE

"Memórias, Crônicas e Declarações de Amor", quinto disco da cantora, "namora" solidão

Tiragem especial de 15 mil CDs tem encarte com auto-retratos da cantora


A dança da solidão

Marisa Monte/Divulgação
Auto-retrato da cantora e compositora Marisa Monte, que lança "Memórias, Crônicas e Declarações de Amor", seu quinto disco solo


PEDRO ALEXANDRE SANCHES
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

Embora o título, "Memórias, Crônicas e Declarações de Amor", aponte na direção do romantismo, sua autora, a carioca Marisa Monte, 32, o define antes como um disco sobre solidão.
"São músicas que fiz nos últimos quatro anos, e fui percebendo que muitas falavam de amor -de amor de casal, dual, passional, ou de amor transpessoal, com "A" maiúsculo", explica a cantora e compositora, começando a definir seu quinto CD.
Mas... a solidão. "Por trás de todo esse assunto do amor, existe o da solidão, que talvez seja o tema desse disco. É comum a todos nós. É uma loucura o ILOVEYOU, um vírus que chegou para mostrar a proporção da carência do ser humano", define ela, que conserva parceria com Davi Moraes, também seu guitarrista.
Vêm em embalagem peculiar as 13 canções produzidas por Marisa e o norte-americano/pernambucano Arto Lindsay -maioria de temas sentimentais, forrados de violinos e violoncelos.
Numa primeira tiragem limitada (15 mil exemplares), ganham embalagem como de um livro, com dezenas de fotos de Marisa tiradas por Marisa. O libreto recebe, ainda, versão ampliada, que estará em cartaz nas livrarias.
O repertório reúne maioria de inéditas do círculo de compositores Marisa/Carlinhos Brown/Arnaldo Antunes (mais, agora, Lucas Santtana). E uma inédita de Caetano Veloso, "Sou Seu Sabiá", que fecha o álbum.
No setor de regravações, já uma marca registrada sua, entram "Para Ver as Meninas" (71), de Paulinho da Viola; "O Que Me Importa", de Cury (gravada em 72 por Tim Maia e, segundo Marisa, antes ainda por Martinha); "Cinco Minutos" (74), de Jorge Ben (Jor); e "Gotas de Luar", de Nelson Cavaquinho e Guilherme de Brito, que ela encontrou num disco coletivo do final dos 70.
Os autores começam a se repetir -já visitara os repertórios de Tim, Ben e Paulinho. A recorrência refletiria um recorte ideológico? "Não, é gosto. É claro que gosto do Chico Buarque, mas tenho muita coisa pela frente, posso cantá-lo ainda. É muita gente, amo muitos compositores. Não me identifico com nenhuma corrente ideológica, assim como não me identifico com correntes religiosas -mas não acho que seja uma pessoa sem crença, sem fé. Não sinto necessidade de buscar uma ideologia específica, acho aprisionador. Posso ter um pouco da ideologia do Gentileza, do Gandhi, um pouco do Roberto Carlos com um pouco do Tim Maia, um pouco do Rainha e um pouco do...", interrompe-se.
Na única composição só sua do CD, "Gentileza", Marisa até parece frequentar certo ativismo, lembrando que "apagaram tudo/ pintaram tudo de cinza/ a palavra do muro/ ficou coberta de tinta". Mas, não, não é de muros pichados por palavras de ordem que está falando.
"O profeta Gentileza era uma figura popularíssima no Rio, um andarilho que pregou por 40 anos nas ruas e espalhou escritos por pilares de viadutos. Um dia passei em frente e vi que haviam passado cal por cima do trabalho dele. Fiz a música imediatamente."
Gentileza é mais um símbolo popular que Marisa reaviva, como ao produzir CD para a Velha Guarda da Portela ou ao cantar temas de seca, e como costumam fazer seus amigos Walter Salles (no filme "Central do Brasil") e, em registro limítrofe, João Salles (ao apadrinhar financeiramente um traficante de drogas).
Encara a suspeição que vez ou outra acompanha as "trombadas" entre bem nascidos e "populares": "Acho ótimo, tem mais que suspeitar mesmo. Eu mesma suspeito muito. Não se pode acreditar em tudo que se lê, em tudo que se vê, em tudo que está escrito. A discussão crítica é interessante, quero que desconfiem de mim. Porém, as intenções são as melhores, tanto as minhas como as de Walter e João. Sou fã deles. São compromissos claros com a arte". À arte, então.



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