São Paulo, sexta-feira, 11 de maio de 2001

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CRÍTICA

"Pra Falar de Amor" é produto de maturidade do cantor

DO ENVIADO AO RIO

Ainda que com essas idéias de jerico de country urbano, a Abril Music realiza o que era o óbvio ululante: o retorno de Erasmo Carlos, um dos artistas cruciais da música popular brasileira como ela é conhecida hoje.
Mais conhecido como sombra de Roberto Carlos -o que ele não é-, Erasmo é daqueles raros artistas de síntese, que elaboram o trânsito de vertentes que aos olhos e ouvidos de todos pareceriam irreconciliáveis.
Erasmo é (como seus parceiros Jorge Ben e Tim Maia são ou foram) jovem guarda, é samba, é bossa nova, é rock'n'roll, é samba-rock, é black music, é tropicália, é besteirol. É Roberto Carlos e Caetano, Wanderléa e Elis, Rita Lee e Chico, todos num só.
"Pra Falar de Amor" é, então, um produto de maturidade do cara que é tudo isso aí. Chega intimidado pela besteira do country, esquecido um tico do samba, do samba-rock, do soul, do funk.
Mas quem é rei não perde a majestade, nem cantando tolice feita para Kátia ("não está sendo fácil...") ou por jovem roqueiro imaturo ("Pra Falar de Amor", de Marcelo Camelo) -são os momentos mais frouxos do CD.
De resto, o tratamento "roots" não afoga espantos e espantos. Tudo o que há de bom em Erasmo Carlos Marisa Monte conseguiu sintetizar em uma frase de "Mais Um na Multidão" -quando ela canta "sou mais um na multidão", assoma das entranhas do tempo o Erasmo de "Sonhos e Memórias" (72), do rock pintado de samba, da voz mais doce e terna de todo o pop nacional.
Felizmente há muitos desses momentos. "Seu Bicho de Estimação" morde-sopra o parceiro eterno de todas as glórias. "Outernet" assume tudo o que tem de antiquada, nosso tiozinho resmungando bem-humorado que o mundo aqui fora é bem mais jóia que as internets. "Quem Vai Ficar no Gol?" brinca de "Pega na Mentira" (81), passa pito nos políticos, pede uma lambuja do mercado.
"Desenho Animado" faz farofa de jovem guarda, do cara que em 65 fazia "Tom & Jerry". O pato que protagoniza a canção é um pato iê-iê-iê, mas também o da bossa; guarda todos os patos que fazem quaquá Brasil afora.
"A Família" e "Ela Conversava com o Olhar", enfim, encenam a morna melancolia do eterno bem-humorado. Ele canta e chora as belezas perdidas, senhor das tristezas, senhor do tempo. É, Erasmo ainda é demais para nossos pobres corações.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)


Pra Falar de Amor
   
Artista: Erasmo Carlos
Lançamento: Abril Music
Quanto: R$ 25, em média




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