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PanAméricas de Áfricas utópicas...
O escritor José Agrippino de Paula, referência nos anos 60, tem seu livro mais importante relançado
SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL
Hoje à noite tem festa no Embu,
vai ter Ray Conniff, vai ter cachaça Pitú -com limão.
Não se trata de aniversário, a comemoração é pelo relançamento
de um clássico da literatura pop
brasileira dos anos 60. Trata-se de
"PanAmérica" (1967), que volta
às prateleiras pelas mãos da editora paulistana Papagaio.
Ray Conniff e Pitú foram as exigências feitas por José Agrippino
de Paula, 63, o dono da festa e autor de "PanAmérica", para que
comparecesse ao convescote.
Agrippino, importante referência para os artistas da tropicália,
atores, diretores teatrais e cineastas da época, atuou na literatura
-"PanAmérica" é sua mais célebre criação-, no cinema -"Hitler no Terceiro Mundo" e produções em super-8- e no teatro
-"Rito do Amor Selvagem"-,
em uma época em que o conceito
de artista multimídia ainda não
estava tão em voga como hoje.
E o ano de 2001 promete resgatar também outros tesouros do
baú de Agrippino. Além de "PanAmérica", a Papagaio promete
relançar ainda o primeiro livro do
autor, "Lugar Público" (1965),
lançado inicialmente pela Civilização Brasileira. Na sequência, a
editora deve colocar no mercado
todos os seus outros livros e textos
fora de catálogo.
Também sua obra cinematográfica será revisitada. O Centro
Cultural Banco do Brasil de São
Paulo exibirá, dentro da mostra
"Cinema Marginal e Suas Fronteiras", o longa-metragem "Hitler
no Terceiro Mundo", que Agrippino filmou em 1968, com Jô Soares e Eugenio Kusnet no elenco. O
ciclo acontecerá entre os dias 14 e
28 de junho.
No segundo semestre, ainda
sem data definida, o Itaú Cultural,
em São Paulo, sediará uma mostra de obras de Agrippino, incluindo os filmes que realizou na
África com a mulher Maria Esther
Stockler. A organização é da videomaker Lucila Meirelles.
Embu
Apesar de ter direcionado sua
obra para o tema das metrópoles
na segunda metade do século 20,
Agrippino hoje vive isolado da
agitação das grandes cidades. Mora sozinho numa casa no Embu,
município que se celebrizou por
ser sede de um intenso mercado
de artesanato, a 25 km de SP.
Vestindo camisa branca, jaqueta jeans, alguns panos à guisa de
calção e alpargatas, Agrippino recebeu a Folha para uma entrevista, na última segunda-feira.
"Estou muito otimista com relação a esse lançamento, acho que,
agora que a pop art ficou mais conhecida, as pessoas podem entender melhor o meu livro", disse.
Agrippino parece viver em seu
passado. A todo momento, refere-se a pessoas e lugares, ou ao cinema novo e à tropicália, como se
ainda estivesse vivendo nos anos
60 e 70. O escritor alterna momentos de lucidez e alienação e
tem sua vida gerenciada pelo irmão, Guilherme.
Agrippino considera que sua
obra será sempre atual. "Acho
que o livro não vai envelhecer,
pois escolhi para serem meus personagens figuras que são legendárias, como a Marylin Monroe ou o
Yul Brynner, que as pessoas conheciam e vão continuar conhecendo enquanto a cultura americana for tão dominante."
O escritor também ressalta que
não gosta que o protagonista de
"PanAmérica" seja denominado
dessa maneira.
"As pessoas dizem que ele é um
protagonista, mas é justamente o
contrário, pois o protagonista
precisa da ação, e o meu personagem não é movido pela ação, ele é
um observador, somente um observador", diz, pausadamente,
enquanto alisa a espessa barba.
Agrippino diz que não tem mais
o hábito de ler e aponta uma justificativa.
"Leio pouco. A literatura ocidental ficou muito igual. Depois
de ler uns cem livros, a pessoa já
pode dizer que conhece toda a literatura ocidental", diz.
Apesar de viver há muitos anos
longe do centro de São Paulo,
Agrippino diz que a metrópole
ainda o fascina. "Sempre achei
que as metrópoles eram foco de
criação, um lugar para exercitar a
criatividade, quero continuar a
escrever romances sobre cidade,
mas quero o realismo, não a literatura fantástica que usei em "PanAmérica", nem o estilo da literatura regional, não me interessa."
Tropicália e pop art
Agrippino é hoje conhecido por
ter influenciado a geração da tropicália. Curiosamente, não se diz
muito identificado com esse grupo, pois prefere se considerar um
"artista da pop art".
Caetano Veloso é, talvez, seu admirador mais entusiasmado no
cenário artístico. Além de tê-lo
elogiado muito em seu "Verdade
Tropical" (1997), o cantor baiano
agora assina o prefácio da nova
edição de "PanAmérica". Ali, diz
que o livro soa como se fosse "a
"Ilíada" na voz de Max Cavalera".
Uma homenagem do cantor a
Agrippino pode ser ouvida em
"Sampa" (do disco "Muito"):
"PanAméricas de Áfricas utópicas/Do mundo do samba /Mais
possível novo quilombo de Zumbi" ou no disco "Doces Bárbaros",
com "Eu e Ela Estávamos Ali Encostados na Parede".
Também se dizem influenciados pelo escritor o músico Arnaldo Antunes, o diretor teatral José
Celso Martinez Corrêa e o artista
plástico José Roberto Aguilar
-que assina a ilustração de capa
dessa edição, entre outros.
PANAMÉRICA - De José Agrippino de
Paula. Editora: Papagaio (tel. 0/xx/11/
3051-5544). Quanto: R$ 25 (258 págs.).
Na internet:
www.editorapapagaio.com.br
LANÇAMENTO DO LIVRO
"PANAMÉRICA" - Onde: livraria
Embook (praça Nossa Senhora do
Rosário, 45, loja 7, Centro, Embu).
Quando: hoje, às 20h
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