|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
saiba mais
Montaigne vê velhice de dois modos
MANUEL DA COSTA PINTO
COLUNISTA DA FOLHA
Velhice como libertação
dos apetites carnais e serena preparação para a morte; velhice como decadência do corpo e visão aterrorizante do fim. Essas duas
maneiras de perceber o
envelhecimento -mencionadas por Caetano-
estão em Montaigne.
Qual delas corresponde
àquilo que o escritor francês sentia? A pergunta pede uma resposta categórica -e tudo o que Montaigne recusa são raciocínios
definitivos.
A novidade e o frescor
de Montaigne estão na oscilação dos pontos de vista. "O homem é um tema
maravilhosamente vão, diverso e mutável", escreve
ele nos "Ensaios" -livro
que criou a noção moderna de sujeito, descobrindo
a cisão entre experiência
interior e vida pública.
Ponto de passagem entre o mundo medieval e a
modernidade, os "Ensaios" mesclam a sabedoria antiga com o bom-senso da razão experimental.
Recolhido na biblioteca de
seu castelo, Montaigne
conserva a sombra dos
clássicos, para os quais a
vida é aprendizado da
morte, remédio de todos
os males, segundo Sêneca.
Logo, porém, percebe
que "é pura tolice recorrer
a exemplos alheios e escolásticos". Abandona então
as idéias estóicas de virtude moral e indiferença à
morte, entregando-se ao
registro "naturalista" de
seus temores, àquela constatação das deficiências de
que fala Caetano. A vivência livresca não pode ser
descartada: é a própria
fonte da cultura; mas soma-se a ela a experiência
do indivíduo que contempla seu naufrágio.
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Compositor escolhe 20 filmes para ciclo Índice
|