São Paulo, terça-feira, 11 de junho de 2002

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NET CETERA

Vídeo de Daniel Pearl é documento histórico

SÉRGIO DÁVILA
DE NOVA YORK

Apesar dos esforços do FBI (a polícia federal norte-americana) de tirar do ar todos os sites que ousaram exibir as cenas, ainda é possível ver o vídeo com o assassinato de Daniel Pearl na internet. A iniciativa é do site do jornal "The Boston Phoenix" (www.bostonphoenix.com), que publica em seu site link para as cenas (prohosters.com/pearl).
De acordo com editorial da publicação, intitulado "Liberdade de Escolha", era preciso mostrar as cenas em que o correspondente do diário econômico "The Wall Street Journal" no Oriente Médio é morto por extremistas islâmicos no Paquistão. A questão, diz o jornal, é histórica.
O contra-argumento do FBI é que se trata de uma prova de crime e, como tal, não pode ser exibida fora de um tribunal em que o crime esteja sendo julgado. Já a família do jornalista declarou que aqueles que assistem ao vídeo "se prestam sem vergonha ao plano dos terroristas".
Todos são pontos defensáveis.
Eu assisti ao vídeo no último fim de semana. Trata-se na verdade de um clipe montado pelos extremistas. Por sua importância histórica e tudo o que representa, é o "Zapruder Film" de minha geração. Para quem não se lembra, Abraham Zapruder foi o único cinegrafista amador que registrou o assassinato de JFK, em 21 de novembro de 1963.
No "Pearl Film", a cena em que o jornalista norte-americano é decapitado impressiona, claro, pela violência, embora passe a sensação de que Pearl já estivesse morto ao ser decepado. Se não diminui a selvageria, ao menos sugere o consolo de que ele não tenha sofrido tanto.
Paradoxalmente, no entanto, não é essa a cena mais violenta. Impressiona mais ver o repórter no segmento prévio. É quando ele é obrigado a fazer sua declaração de simpatia à criação de um Estado palestino e contra Israel.
"Sou judeu, meu pai é judeu", começa ele, quase esboçando um sorriso, como se estivesse falando para uma platéia de estudantes de jornalismo. Seus olhos vagam sem se fixar na câmera, talvez já consequência das torturas que sofreu, talvez por estar sem os óculos que usou durante a vida toda.
Pearl está obviamente perturbado, mas se esforça para mostrar uma certa descontração, por certo tentando ganhar a simpatia dos terroristas, barganhando internamente em sua cabeça que, se fizesse tudo "direito", poderia sair daquela com vida.
Não sai, como todos nós sabemos. Ou deveríamos saber, e para isso a liberdade de poder acessar o vídeo é fundamental.

E-mail: sergiodavila@uol.com.br

Site: www.uol.com.br/sergiodavila



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