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São Paulo, quarta-feira, 11 de junho de 2003

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CRÍTICA

Record abre museu de afetividades de sofá

XICO SÁ
CRÍTICO DA FOLHA

A nostalgia, precoce ou com antecedentes históricos é produto de primeira linha do veículo cuja linguagem mor é a repetição. De novo e de novo outra vez. Na novela de Manoel Carlos ("Mulheres Apaixonadas") se repete chororôs à Glória Magadan, no futebol que educou nosso olhar para pedir repeteco e tira-teima, na metalinguagem barata do "Vídeo Show" ou no êxtase de Alice/Daniella Cicarelli -mirem-se no sorriso do gato de Lewis Carroll- no "País da MTV".
Lê-se eterno flashback, as imagens dos especiais de comemoração dos 50 anos da TV Record -sábado passado foi o segundo de uma série de programas-, que funcionam como um museu de tudo das nossas afetividades do sofá. Com a mesma moral de todas as repetições ditas históricas: "Ah, como era boa a televisão que se fazia antigamente". Pura balela. Coisa de quem acredita no discurso fascistóide que defende uma "programação de qualidade" na TV.
Coisa de quem via o Chacrinha como um circo "alienante" até o começo dos anos 80 e agora o protege sob aura cult -esse truque usado pela classe média metida para se apropriar do patrimônio brega nacional, talvez herança dos sequestros intertextuais do tropicalismo.
Vistas sem a moral da superioridade histórica, as imagens da TV Record cinquentona são até divertidas. Foram feitas para entretenimento, quando essa indústria típica dos anos "Caras"/Adriane Galisteu -ótima como apresentadora do especial, que tem também Boris Casoy no front- ainda engatinhava e não sabia que no futuro tudo viraria pó nostálgico em 15 segundos.
Embora os personagens rejeitem seus infernos anteriores, a coleção de depoimentos dos especiais, que incluem Roberto Carlos no programa que irá ao ar neste sábado, é outro divertimento assegurado. O rei da jovem guarda deve muito da carreira aos tempos dourados da Record, quando ainda não trocava um brotinho de minissaia por um templo inteiro de evangélicas em transe.
Tem também o Miéle (lembram do Miéle?) que, como poucos, vive o milagre da ressurreição televisiva -quando menos esperamos, lá está o homem de volta. Mas, por favor, chega de repetir a imagem do Sérgio Ricardo quebrando de novo aquele violão.


Especial 50 Anos da Record   
Quando: sábado (14), às 22h15, na Record



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