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Osesp interpreta Sofia Gubaidulina
A russa, uma das principais compositoras eruditas do mundo, tem suas obras de vanguarda tocadas hoje, amanhã e sábado
Perseguida pelo regime comunista, Gubaidulina passou anos de sua vida compondo para animações, filmes e documentários
ADRIANA PAVLOVA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
A senhora de olhar doce e
mãos ágeis que, muito provavelmente, é hoje a compositora
erudita mais importante viva
começou sua história de experimentações sonoras ainda menina, batucando num piano
caindo aos pedaços.
As lembranças do piano de
cauda vagabundo comprado
pela família pobre para alegrar
os dias cinzentos das duas filhas na cidade industrial de
Chistopol, na região central da
então União Soviética, são o
início da conversa com Sofia
Gubaidulina, 78.
"Explorávamos tudo, abríamos o teclado, mexíamos no
pedal, tocávamos as cordas. Na
vida real não tínhamos nenhum tipo de riqueza, mas
aquele piano preencheu a minha vida e deu sentido a ela. Ali
percebi que da maior pobreza
podemos extrair riquezas.
Aprendi a experimentar e a improvisar, descobrindo na música o meu refúgio", diz ela.
Pouco antes da entrevista,
com partituras em punho e um
bloquinho de anotações na
mão, Gubaidulina podia ser vista solitária na plateia da Sala
São Paulo, em meio a um ensaio
da Osesp (Orquestra Sinfônica
do Estado de São Paulo).
Serena, toda vez que era chamada pelo maestro, o alemão
Alexander Mickelthwate, corria rapidamente até a beirada
do palco, para dar pistas sobre
as dissonâncias de sua música
repleta de contrastes sonoros.
Gubaidulina faz sua primeira
visita ao Brasil atendendo a um
convite da Osesp. A cada temporada, a orquestra escolhe um
compositor vivo de peso para,
com a presença dele, fazer a estreia de peças contemporâneas.
Foi assim com o polonês
Krzysztof Penderecki e será assim hoje quando Gubaidulina
assistir à estreia nacional de
"Two Paths", de 1998, e "Stimmen... Verstummen...", de 1986,
num programa que tem ainda a
"Sinfonia nº 26, Lamentação",
de Haydn, escolhida como
complemento pela autora.
"Sinto que as três têm a mesma raiz. É como se buscassem o
mesmo sentido", explica ela.
Apesar das perseguições políticas e religiosas (um dos avôs
dela era muçulmano) e até de
uma doença (escorbuto), Gubaidulina chegou ao Conservatório de Moscou ainda jovem.
Como desde cedo se interessou por pesquisas mais inusitadas, sofreu censuras na escola,
onde era vista como mais próxima da vanguarda ocidental
do que do comunismo.
Um dos seus principais incentivadores, lembra, foi Dmitri Shostakóvich (1906-1975).
"Ele era o presidente da banca
para a minha pós-graduação.
Ele não só teve muito interesse
na minha obra, como defendeu
as minhas pesquisas estéticas."
Seu estilo vanguardista, contudo, não agradava ao regime.
Para sobreviver nos anos 70 e
80, Gubaidulina compôs para o
cinema. Filmes, documentários e desenhos animados foram o terreno perfeito para
suas experimentações.
No fim dos anos 80, com a
abertura política, suas composições começaram a romper a
"cortina de ferro". "Offertorium", peça de 1980, foi gravada
pelo violinista Gidon Kremer.
A Rússia, enfim, começava a
reconhecer seu talento. Mas
em 1992, em busca de tranquilidade, Gubaidulina mudou-se
para a periferia de Hamburgo,
na Alemanha, onde vive.
OSESP
Quando: hoje e amanhã, às 21h; sáb.,
às 16h30
Onde: Sala São Paulo (pça. Julio
Prestes, s/nº, tel.: 0/xx/11/3223-3966)
Quanto: de R$ 30 a R$ 104
Classificação: 7 anos
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