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TEATRO
Gao Xingjian leva "À Beira da Vida" e "Dialogar-Surpreender" a festival
Nobel mostra duas peças em Avignon
BETTY MILAN
ENVIADA ESPECIAL A AVIGNON
O Prêmio Nobel de Literatura de 2001, Gao Xingjian,
participa do Festival de Avignon
com duas peças, "À Beira da Vida" e "Dialogar-Surpreender".
Em "À Beira da Vida" a história
começa por uma ruptura. Uma
mulher não suporta mais o homem com o qual ela vive. A usura
do tempo revelou a grosseria da
vida cotidiana, a vaidade e a impostura. A mulher, então, acerta
as contas. Para isso faz uma investigação minuciosa sobre a própria
vida. Fala de si mesma na terceira
pessoa, fazendo releituras, invenções. Um monólogo atormentado, mas não sem humor de que a
direção fez um coro polifônico. A
palavra não é tudo. Ao lado da
atriz, uma dançarina, um palhaço
e um manipulador mostram a relatividade de todo discurso feito
de palavras.
Trata-se de um ato narrativo
que se realiza através de questões
e respostas, à maneira dos kuan,
diálogos filosóficos entre o mestre
e o discípulo na escola budista que
marcou o pensamento dos letrados chineses sob a dinastia Tang
no início do século 7.
Tudo na peça depende do trabalho dos atores e de um dançarino
japonês. É um diálogo desesperado entre um homem e uma mulher, que um monge dançarino
acompanha em silêncio, desenvolvendo com um ovo e diferentes instrumentos de percussão o
seu ritual. O homem usa o tu para
falar de si. A mulher, o ela. Isso
cria uma grande distância dos
atores em relação a si mesmos e
também entre si, evidenciando o
mal estar entre os sexos.
A propósito da sua dramaturgia, Gao declarou à Folha: "A particularidade do meu texto é que o
personagem fala na primeira pessoa, mas também na segunda e na
terceira. Quando introduzimos
essas três pessoas, o efeito sobre o
trabalho dos atores é interessante.
Assim, quando o ator diz tu referindo-se a si mesmo, cria-se uma
distância e uma teatralidade que é
inerente ao desempenho".
E completa: "A teatralidade da
minha peça não está no espaço do
teatro, ela está no trabalho do
ator, que varia segundo o pronome que ele usa, o eu, o tu ou o ele.
E, se houver um parceiro, que fala
de si na terceira pessoa, a situação
se complica ainda mais, ela se
enriquece. Em "Dialogar-Surpreender" os personagens começam dizendo eu. De repente,
usam o tu, e o espectador não sabe se o tu se refere a ele ou ao personagem. É precisamente essa
ambiguidade que me interessa
criar".
Betty Milan é psicanalista e escritora,
autora de "O Clarão", entre outros.
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