São Paulo, sexta-feira, 11 de agosto de 2006

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Crítica/cinema

Filme escorrega na cafonice ao retratar Ademir da Guia

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

O jogador Ademir da Guia, filho do legendário zagueiro Domingos da Guia, herdou do pai o epíteto de "Divino", pela extrema elegância de seu jogo, louvada num poema célebre de João Cabral de Melo Neto.
O documentário "Um Craque Chamado Divino", dirigido por Penna Filho, procura reconstituir o essencial da trajetória do craque. Talvez por um desejo de discrição condizente com o estilo sereno e "low profile" do retratado, o filme adota um formato convencional, alternando lances de jogos com depoimentos de cronistas esportivos, ex-colegas de profissão, amigos de infância. É como uma longa matéria especial de um programa esportivo.
Ocorre que os depoimentos, um tanto repetitivos, quase nunca escapam do laudatório, e o resultado final acaba sendo uma hagiografia, como já acontecia num documentário como "Pelé Eterno", de Aníbal Massaini. Nenhuma palavra é dita, por exemplo, sobre a controversa atuação do ex-jogador como vereador em São Paulo.
A pesquisa de imagens é muito boa, dando ao espectador mais jovem uma idéia bastante razoável da classe suprema de Ademir da Guia. Mas, talvez por uma limitação de nossos arquivos futebolísticos, há quase só lances de gols de Ademir, o que pode criar uma falsa imagem do craque como artilheiro, quando sua principal virtude era a organização e a armação das jogadas.

Cafonice
Nos momentos em que tenta ser "artístico", abusando da câmera lenta e dos jogos de palavras (como "Alegria de Domingos", "Alegria dos domingos", "Guia da bola", "Guia do tempo"), o filme "perfuma a flor", para usar uma expressão de João Cabral, e se aproxima de novo de "Pelé Eterno" naquilo que este tem de cafona.
Alguns depoimentos, como o do ex-colega de Palmeiras Dudu, ou dos amigos de infância Helinho e Joscelino, são calorosos e reveladores. E vários lances do craque são comoventes como uma obra de arte. Mas é difícil imaginar que "Um Craque Chamado Divino" atraia ao cinema quem não é aficionado do futebol. Talvez, a exemplo do que ocorreu com "Pelé Eterno", o destino mais feliz deste documentário seja o DVD ou a grade televisiva.


UM CRAQUE CHAMADO DIVINO   
Direção: Penna Filho
Produção: Brasil, 2006
Quando: a partir de hoje no HSBC Belas Artes


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