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Cinema/crítica
Neil Jordan cria filme artificial
CRÍTICO DA FOLHA
É difícil desenhar caminhos ou encontrar rastros de coerência na
carreira de Neil Jordan, cineasta que pretende ser mais um
contador de histórias do que
um criador de imagens. Como
narrador, Jordan atira para todos os lados, alternando momentos mais inspirados ("À
Procura do Destino", "Traídos
Pelo Desejo") a outros menos
felizes ("Entrevista com o
Vampiro", "A Premonição").
Mesmo tendo lá seus momentos, "Café da Manhã em Plutão"
faz parte desse segundo grupo.
Mais uma vez, Jordan adapta
um livro de Patrick McCabe,
que já foi fonte de inspiração
para o cineasta em "Nó na Garganta" ("The Butcher Boy", de
1998). Mas "Café da Manhã em
Plutão" tem muito mais pontos
em comum com "Traídos pelo
Desejo" (1992), filme que tornou o diretor irlandês conhecido e é infinitamente superior
em todos os aspectos.
Nos dois casos, o cineasta
procura combinar uma abordagem tradicional da política (o
terrorismo e o Exército Republicano Irlandês) a outra mais
contemporânea, a "política dos
corpos", de questões ligadas à
identidade e à sexualidade.
"Kitten"
Na Irlanda católica, machista
e endurecida pela guerra civil
nasce Patrick Braden (Cillian
Murphy, indicado ao Globo de
Ouro de melhor ator), um garoto que cresce sem esconder sua
homossexualidade. Ele adota o
nome de "Kitten" e se impõe na
pequena cidade onde vive, sem
dar muita bola para o que
acham dele. O sexo não é uma
questão para ele, que sempre
teve muito claro para si o que
queria da vida sexual e afetiva.
Mas seu entorno, é, sim, uma
questão. Adotado por uma família local, sem conhecer seus
verdadeiros pais, ele desconfia
ser filho do padre (Liam Neeson) e sonha conhecer a mãe,
que partiu e nunca mais voltou.
Descobrir seu paradeiro é o
pretexto para que ele vá para
Londres, em pleno desbunde
dos anos 70, abandonando o
provincianismo de sua cidade.
Essa trajetória bacana, porém, sofre pelo fato de Jordan
não ter encontrado o tom do filme. O diretor busca uma leveza
que nunca é alcançada de fato,
em parte pela falta de inspiração de sua "mise-en-scène", em
parte pela inadequação do ator
Cillian Murphy ao papel.
Murphy parece acreditar que
voz afetada e um pouco de maquiagem são suficientes para
dar credibilidade a um personagem homossexual, mas não
convence. E Jordan não contorna esse problema. Ao contrário, toda sua direção reforça
essa artificialidade que não parece ter sido uma meta em si,
mas o resultado de um acúmulo
de soluções equivocadas.
(PEDRO BUTCHER)
CAFÉ DA MANHÃ EM PLUTÃO
Direção: Neil Jordan
Produção: Inglaterra/Irlanda, 2005
Com: Cillian Murphy, Stephen Rea e Liam Neeson
Quando: a partir de hoje no Espaço
Unibanco 1, Frei Caneca Unibanco Arteplex 1, HSBC Belas Artes/ Sala Cândido Portinari
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