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Crítica/"Madre Joanna dos Anjos"
Desejo é o centro de obra-prima polonesa
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
É a arquitetura o que impressiona primeiro em
"Madre Joanna dos Anjos". A disposição do convento,
numa colina solitária. O branco
de suas paredes, contrastando
com o negro dos espaços que se
anunciam por trás dos arcos
pronunciados. A amplitude das
salas, onde o vazio se manifesta
como uma evidência.
Em seguida vêm as relações.
O contraste entre o negro e o
branco é o mais marcante: o negro do traje do padre, o branco
das freiras, por exemplo.
Seria possível falar, ainda, da
taberna e dos estranhos habitantes do local, mas o essencial
é que neste filme estamos diante de um caso de possessão diabólica da superiora de um convento, madre Joanna justamente.
E o filme retoma um caso histórico, ocorrido no século 17 (e
mais tarde filmado também
por Ken Russell, de forma menos impressionante, em "Os
Demônios", de 1971).
Sabemos que o padre Joserf,
enviado para salvá-la com seus
exorcismos não é o primeiro.
Trata-se de um teólogo que vive a castigar a carne com um
chicote, mas um homem com
pouca experiência do mundo.
E homens com pouca experiência do mundo tendem a sofrer um pouco nas mãos do diabo. No caso de madre Joanna, há não menos do que oito demônios a ocupar seu corpo.
A luta será difícil. Por um lado, trata-se de saber como
agem os demônios. Por outro, o
que são eles.
Finalmente, a questão mais
angustiante que se coloca ao
exorcista vem do fato de que
madre Joanna simplesmente
não deseja que o diabo a abandone. O desejo é, de resto -e já
se pode presumir desde as primeiras imagens-, o centro de
tudo.
É ele que parece estar na base
da luta entre Deus e o Diabo, a
que correspondem as tensões
de espaço com as quais o diretor Jerzy Kawalerowicz joga
tão habilmente e que potencializam o drama da pureza e da
perversão que cada personagem carrega dentro de si.
Porque estamos, não convém
esquecer, na Polônia -um país
onde o catolicismo é não só radical como, não raro, intolerante (e Kawalerowicz não deixa
de notá-lo, ao introduzir a figura de um rabino, representado,
não por acaso, pelo mesmo ator
que faz o padre).
A fama de Andrzej Wajda de
certa forma ofuscou a de Jerzy
Kawalerowicz no grande momento do cinema polonês, entre os anos 50 e 60 do século
passado.
Isso torna ainda mais oportuna a revisão desta sua obra-prima, que ganhou o prêmio especial do júri em Cannes, 1961, num tempo em que um prêmio
desse queria dizer muita coisa.
MADRE JOANNA DOS ANJOS
Distribuidora: Lume
Quanto: R$ 37,50, em média
Avaliação: ótimo
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