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ANÁLISE
Mailer repórter foi maior que o romancista
Com Tom Wolfe e Truman Capote, o polêmico Norman Mailer formou a santíssima trindade do "novo jornalismo"
CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
ESPECIAL PARA A FOLHA
Norman Mailer prometeu a
si mesmo e ao público que escreveria "o maior romance
americano". Não cumpriu. Produziu muitos livros bastante
longos, mas no terreno da ficção só um foi importante: o primeiro, "Os Nus e os Mortos", de
1948, fruto de suas experiências como combatente na Segunda Guerra Mundial.
Se não inscreveu o seu nome
entre os dos grandes romancistas do país, Mailer conquistou
um lugar na história dos melhores jornalistas e dos mais intensos polemistas que os Estados Unidos conheceram.
Foi empurrado para o mundo dos ensaios e reportagens
em revistas e jornais em parte a
contragosto (precisava do dinheiro que a ficção não lhe proporcionava) e em parte por
convicções políticas (tinha
consciência de que os meios de
comunicação lhe garantiriam
mais proeminência no debate
público do que os livros).
Com Tom Wolfe e Truman
Capote, formou a santíssima
trindade do "new journalism",
o gênero literário que mesclou
as técnicas da ficção com o factualismo da reportagem.
"Os Exércitos da Noite - Os
Degraus do Pentágono" (1968),
sobre os protestos contra a
Guerra do Vietnã, e "A Canção
do Carrasco" (1979), sobre
Gary Gilmore, um assassino
confesso que pediu para ser
executado, estão entre os mais
brilhantes espécimes desse tipo de literatura (ambos estão
entre as cem melhores reportagens do século 20, selecionadas
pela New York University).
Como um dos fundadores do
jornal "Village Voice" e freqüente colaborador de excelentes periódicos como "The New
York Review of Books", Mailer
contribuiu enormemente para
melhorar a qualidade do jornalismo americano e -por extensão- de todos os países que se
deixaram influenciar por ele.
Mas Mailer foi muito além de
simplesmente escrever. Tornou-se militante político e crítico ácido do estilo de vida americano, fascinado pelo papel
preponderante que o sexo, a
ambição e a violência exercem
sobre a cultura nacional.
Iconoclasta, calculadamente
agressivo, mas quase sempre
instigante, talentoso, alcançava
as manchetes da imprensa sensacionalista (ao esfaquear sua
segunda mulher, por exemplo)
com quase a mesma facilidade
com que freqüentava o noticiário político, como ao se candidatar a prefeito de Nova York.
Apesar de ter sido tão famoso
e importante, Mailer morreu
ressentido por saber que seria
lembrado na posteridade não
pelos romances, mas pelo jornalismo.
Numa de suas últimas entrevistas, disse: "Eu acho que o romance é uma forma superior
[ao jornalismo]. Como eu posso
expressar isso? É muito mais
difícil escrever um romance.
Eu não concordo que eu vá ser
mais lembrado como jornalista, embora eu concorde que
muitos irão dizer isso. A ironia
é que talvez eu tenha tido muito mais influência como jornalista do que como romancista."
CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA , livre-docente e doutor em jornalismo pela USP e mestre
em comunicação pela Michigan State University, é diretor de relações institucionais da Patri
Políticas Públicas.
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