São Paulo, domingo, 12 de fevereiro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MÔNICA BERGAMO

Elite aprende a esconder o ouro

Imagine pagar R$ 4 mil por uma bolsa Dior e ter de arrancar o fecho que revela a grife. Ou vestir uma camiseta italiana de R$ 800 da Dolce & Gabbana e, por cima, um moletom velho e barato para tentar disfarçar o poder aquisitivo. São artimanhas cada vez mais presentes na rotina de endinheirados paulistanos, que descobriram que camuflar o luxo ajuda a despistar assaltantes. É longa a lista de truques deste tipo de darwinismo social, que já tem até consultor especializado em dissimulação.

AS BOLSAS MUTILADAS
A empresária Mariana Costa, 24 anos, tomou uma decisão radical: decidiu extirpar o logo metálico de sua bolsa Dior, que "deve ter custado uns R$ 4 mil". "Arranquei porque é questão de segurança", justifica. "E dei o logo para uma amiga, que colou na bolsa que ela comprou na rua 25 de Março", diverte-se.

 

A própria Louis Vuitton percebeu a tendência dos clientes que desejam ter objetos da grife mas não querem dar bandeira. Para eles, há uma linha de bolsas de couro liso, sem aquele "LV" chamativo, mas com os mesmos preços dos outros produtos da marca: até R$ 18 mil.
 

Outra opção são marcas de luxo menos conhecidas. A empresária Fabiana Scali Fernandes, por exemplo, tem 30 bolsas de grandes grifes, mas prefere seus 10 modelos da brasileira Daniela Zylberstajn (R$ 400 a R$ 1.500). "Quem vê o LV estampado na bolsa sabe quanto custou. Já um modelo DZ chama menos atenção pelo preço e mais atenção pela aparência", ensina.
 

Ao tirar os óculos de sol Armani da bolsa Louis Vuitton, a estudante L. Q., que prefere ficar anônima, já não se sente vigiada. O acessório da marca italiana, que custou quase R$ 1.000, fica guardado numa caixinha barata. "É feia, mas serve para despistar bandido." Com os relógios, a mesma coisa: usa os "básicos" no dia-a-dia e guarda os valiosos para fins de semana.

O PILOTO ERA ELA
Parte das motoristas descobriu que fazer parecer que existe um homem dentro do carro ajuda a afastar os bandidos. Uma velha saída é levar no banco do carona o chamado "Ricardão", boneco com bigode e boné. Mas algumas chegam a usar barba e bigode postiços à noite.
 

"Isso é bobagem", diz o consultor de segurança Ricardo Chilelli. "O mais simples e barato é mesmo colocar o bom e velho insulfilm no carro. O bandido brasileiro é vagabundo, só vai na certeza. Se ele não consegue avaliar quem está no veículo, assalta o carro de trás."

A BOLSA-ESCONDERIJO
Quando Roberto Ciqueira foi assaltado, no final do ano passado, viu partirem algumas de suas preciosidades: o relógio Bulgari de R$ 20 mil, a mala Louis Vuitton de R$ 10 mil... Desde então, o administrador de empresas não dá bobeira. "Nunca imaginei que trocaria minha pasta Prada por uma bolsa da C&A para carregar o notebook, mas tenho de andar camuflado para sobreviver."
 

O artifício é moda entre os executivos, que compram mochilas com compartimentos especiais para levar o aparelho sem chamar a atenção. Para Roberto, abrir mão de grifes é um sofrimento. "Sei que preciso andar "em off", mas é muito difícil viver sem as minhas marcas."

O REMENDO BÁSICO
O truque é da estudante Stefanne Minelli, 20 anos: "Corto as etiquetas das minhas roupas Diesel, Dolce & Gabbana, Fendi e costuro um "patch" [adesivo] por cima das originais", revela. São precauções de dupla finalidade. A primeira: evitar assalto. A segunda: conhecer gente. "Ostentação espanta as pessoas", diz. "Meu brinco de brilhantes é da Tiffany, mas quem vê pensa que é bijuteria, por causa do restante do meu visual", contabiliza.
 

O estudante Guilherme Cardoso tem outra estratégia: veste um moletom da Hering por cima de camisetas de marcas mais caras como Dolce & Gabbana para ir à balada. "Chegando lá, é só tirar o agasalho e pronto."

O IPOD QUE NÃO PODE
O cabeleireiro Evandro Ângelo, dono do salão EV, ganhou de presente um dos eletrônicos mais cobiçados do momento: um iPod Video, que custa cerca de R$ 1.800. O brinquedinho faz o maior sucesso entre os amigos de Evandro, mas criou um problema: como encarar o olhar alheio com aparelho tão caro?
 

A solução foi simples: "Troquei o fone de ouvido branco original pelo preto básico. Assim, passo despercebido", conta. "Você não pode fazer questão de mostrar. Segurança é mais importante que vaidade."

O ESPECIALISTA

Os 10 mandamentos da selva

O consultor de segurança Ricardo Chilelli resume os cuidados de segurança em dois tópicos: "Nunca se deixe avaliar e sonegue informações". Ele orienta famílias ricas a não dar bandeira do patrimônio e omitir dados como endereço e telefone, evitando furtos, roubos e até seqüestros. Algumas das lições do consultor para seus clientes:

 

1) "Se usar notebook no aeroporto, troque o aparelho de bolsa dentro do avião. Há grupos de ladrões que trocam informações por celular e ditam o mapa da mina aos companheiros"
 

2) "Quando pagar alguma conta com cheque, nunca coloque o telefone de casa no verso da folha. No máximo, o telefone comercial"
 

3) "Aliás, evite dar cheque na rua. Pagar taxi com cheque é suicídio"
 

4) "Filho de rico não pode nem sonhar em entrar no Orkut", diz ele, que considera o site uma boa fonte para que se descubram os lugares frequentados pela família, por exemplo
 

5) Pelo mesmo motivo, "não colocar adesivos no carro com referências a um alto poder aquisitivo, como escolas, clubes e frases como "Sou criador de Mangalarga'"
 

6) "Ao entrar no carro, verifique se há chiclete colado no pára-brisa: o veículo pode estar marcado para ser assaltado no farol"
 

7)"Não perca tempo parado no carro: entre, dê a partida e coloque o cinto de segurança quando o veículo já estiver em movimento"
 

8) "Quando possível, registre seu celular no endereço da empresa, não no de casa"
 

9) "Tire seu nome da lista telefônica"
 

10) "Deixe os documentos originais em casa. Nas ruas, use cópias autenticadas"


Texto Anterior: Deize "quebra barraco" com Tati
Próximo Texto: Cinema: Pai do "Castelo Rá-Tim-Bum" volta à infância
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.