São Paulo, sexta-feira, 12 de março de 2004

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O vingador do passado

Philip K. Dick, autor de "Blade Runner", retorna do limbo com onda de adaptações de sua ficção paranóica para o cinema

ALEXANDRE MATIAS
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Onde você está enquanto lê estas palavras? Fisicamente, você não saiu do lugar, mas a simples leitura destas letras em seqüência o levam para um ambiente mental indefinível -consciência, alma, ou simples efeitos de reações químicas em nosso cérebro.
Esse terreno de sombras indefinidas é o território de preferência do escritor norte-americano Philip K. Dick (1928-1982) -cuja obra finalmente é vingada graças à onda de adaptações para o cinema, como é o caso da mais recente "O Pagamento", de John Woo, que estréia hoje em todo o Brasil.
Desde as primeiras adaptações de suas histórias para a telona -"Blade Runner" (82), baseado em "Andróides Sonham com Ovelhas Elétricas?", e "O Vingador do Futuro" (90), inspirado em "We Can Remember It for You Wholesale"-, K. Dick, considerado um dos grandes autores de ficção científica do século passado, vem sendo redescoberto.
Uma parte porque sua obra utiliza clichês como o futuro, robôs, naves especiais e viagens no tempo para discutir conceitos filosóficos, existenciais e éticos, antecipando em 20 anos discussões que hoje acompanham áreas tão diferentes quanto genética, propriedade intelectual, segurança, biotecnologia e comunicações.
Outra parte por causa do apoio dos herdeiros do autor, que tornaram públicas suas intenções ao assumirem, no final de 2003, o site Philipkdick.com, antes editado por fãs. Laura Leslie, uma das filhas do escritor, explicou à Folha, por e-mail, que não houve nenhum atrito com os fãs que criaram o primeiro site.
"Queremos transformar a página tal como está hoje em um repositório único e extenso do legado do trabalho do nosso pai. Planejamos, entre outros, publicar cartas que não foram incluídas nos livros "Selected Letters", entrevistas tanto impressas quanto em áudio e a maior parte de "Exegesis", um trabalho de 8.000 páginas", conta Leslie.
Além do site, 2004 ainda vê a republicação da versão oficial do livro "The Unteleported Man", com o título de "Lies Inc.". Escrito em 64 e 65, o livro só foi publicado integralmente após a morte do escritor, mas sem incluir alterações feitas por Philip em 1979. Além disso, será reeditado nos EUA o livro "In the Pursuit of Valis, Selections from Exegesis", compilado e editado pelo biógrafo do autor, Lawrence Sutin. Nele, Dick tenta desvendar o surto de esquizofrenia que o fez acreditar viver em duas épocas, simultaneamente, em março de 1974.
Mas é no cinema que o nome do autor está fervendo. Segundo Laura, entre os próximos livros e contos a caminho de ser transformados em filmes estão "A Scanner Darkly" (que deve ser dirigido por Richard Linklater), "Time Out of Joint" (nas mãos do produtor Joel Silver), "Valis", "Radio Free Albemuth", "Flow My Tears the Policeman Said", "Ubik" e "The King of Elves".
Mas a filha prefere se abster quando questionada sobre o que acha das adaptações para o cinema: "Entendemos que muitos dos filmes não sigam a história original e incluam apenas idéias ou conceitos dos livros, mas hoje vemos os filmes como uma forma de introduzir K. Dick a um novo público, que lerá seus livros e contos". Voltando para aquela área específica entre o olho e a letra, que você está prestes a sair.


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