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CINEMA - O QUARTO VERDE
Filme de 78 mostra lado lúgubre de Truffaut
da Equipe de Articulistas
Quando foi lançado, em 1978, "O
Quarto Verde" foi considerado
uma obra menor de François Truffaut.
Hoje, passados mais de 20 anos, é
possível apreciar melhor o mórbido lirismo do filme, que contrasta
com a luminosidade dos clássicos
mais conhecidos do cineasta.
A trama de "O Quarto Verde"
inspira-se em dois contos do escritor norte-americano Henry James
(1843-1916), "O Altar dos Mortos"
e "Os Amigos dos Amigos", transpondo seu entrecho para a França
da década de 20.
Na versão de Truffaut, o protagonista, Julien Davenne (interpretado pelo próprio diretor), é um homem que vive para o culto de seus
mortos -a esposa Julie e os amigos que ele viu morrer nas trincheiras da Primeira Guerra.
Davenne trabalha como redator
num pequeno jornal de província e
vive recluso numa pensão, sem
prazeres e sem amigos.
Um dia conhece uma jovem, Cecilia (Nathalie Baye), que compartilha com ele o amor aos mortos,
mas não a indiferença pelos vivos.
O filme se constrói todo em torno da tensão entre o impulso de vida de Cecilia -que implica compromisso com o que é transitório e
imperfeito- e o ascetismo irredutível de Davenne, que não perdoa,
por exemplo, um amigo viúvo por
ter-se casado de novo, "traindo" a
primeira mulher.
Foi justamente o jogo entre o
contingente e o absoluto, tão caro a
James e ao próprio Truffaut, que
motivou o cineasta a mergulhar de
corpo e alma no filme.
Sua decisão de interpretar o papel do protagonista, em vez de entregá-lo a um ator profissional, é
uma prova do envolvimento íntimo do diretor com seu tema.
""O Quarto Verde" é como uma
carta escrita à mão. Escrita à mão,
a carta não sai perfeita, a letra talvez fique um tanto tremida, mas
ela é sua, é a sua escrita", resumiu
Truffaut numa entrevista.
O cineasta aproveita também para homenagear, com fotos que
aparecem no altar dos mortos
construído pelo protagonista, seus
autores mais queridos: James,
Proust, Wilde, Cocteau.
A atmosfera lúgubre criada pela
esplêndida fotografia de Nestor
Almendros, pela luz de velas, pelos
muitos espelhos e pela predominância de cenas internas adequa-se à perfeição à história que Truffaut tem a contar.
Se há uma coisa a lamentar no filme é o excesso de verbalização, sobretudo a explicitação, pela heroína, de seu amor por Davenne.
Enquanto o esboço de romance
entre os dois personagens permanece não dito, funciona como uma
força subterrânea que anima o filme.
Depois que se revela, o drama
perde muito do seu interesse.
De todo modo, é um prazer ver
Truffaut em cena, defendendo como pode a dignidade austera e
quase doentia de seu personagem
-um personagem tão distante do
homem que amava as mulheres, o
cinema e a vida.
(JOSÉ GERALDO COUTO)
Filme: O Quarto Verde
Produção: França, 1978
Direção: François Truffaut
Com: François Truffaut, Nathalie Baye, Jean
Dasté, Jean-Pierre Moulin
Quando: a partir de hoje, na Sala
Cinemateca
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