São Paulo, quarta-feira, 12 de maio de 2004

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ANÁLISE

"Cabocla" foge de fórmula "realista"

ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA

As novelas estão em alta novamente -talvez porque andem experimentando formas menos naturalistas de representar. Como bem comentou a colunista da Folha Bia Abramo há algumas semanas, "Celebridade" e "Da Cor do Pecado" capricham na vilania. O desejo extremo de vingança leva às vias de fato. Lutas corporais deixam hematomas na pele, mas não tiram o fôlego de personagens incansáveis na arte de renovar chantagens.
Cenários e figurinos cariocas contemporâneos dão um toque de verossimilhança aos personagens caricaturais.
A nova novela das seis, "Cabocla", um remake de Benedito Ruy Barbosa, que estreou anteontem, também se afasta -mas de maneira diferente- da fórmula "realista" que fez o sucesso do gênero a partir de fins dos anos 60.
Como outros trabalhos do autor, que agora supervisiona suas filhas, responsáveis pela adaptação do original, a história é distanciada no tempo e no espaço.
"Cabocla" se passa em uma pequena cidade fictícia de coronéis no início do século. A capital faz o contraponto convencional, comparecendo em situações características da paisagem urbana, ou ainda com rápidas inserções documentais em preto-e-branco. É da capital que vêm formosas professoras, engajadas na dura tarefa de civilizar.
Cenários e figurinos dão a tônica de fábula nostálgica à estrutura dramática perfeitamente convencional. A marca autoral se mostra no visual. A partir de "Pantanal" as novelas de Benedito contribuíram para desmistificar versões limitantes do que seja a "linguagem televisiva". Seqüências longas, com planos gerais, enfatizam a vastidão da paisagem rural. A música regional marca o ritmo pausado da narrativa previsível.
Envolvimento amoroso entre filhos de coronéis inimigos formados no ambiente arejado da cidade marca o conflito de geração. Oposições de classe e gênero estão garantidas no interesse não correspondido da "patroazinha" pelo peão do inimigo de seu pai, ou na paixão anunciada entre o "doutor coronelzinho" tísico e a beldade rústica.
"Cabocla" sugere um veio cômico no qual Tony Ramos e Patrícia Pillar aparecem confortáveis. De resto a produção cuidada e adequada ao horário "cor-de-rosa" não promete surpresas.


Esther Hamburger é antropóloga e professora da ECA-USP

CABOCLA. Quando: de seg. a sáb., às 18h05, na Globo.


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