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FOTOGRAFIA
Edinger redescobre a visão da insanidade
ANA MARIA GUARIGLIA
free-lance para a Folha
Depois de quase dez anos engavetado, o fotógrafo Claudio Edinger lançou o livro "Loucura",
com uma sequência de registros
que mostra os doentes mentais do
Juqueri, em Franco da Rocha (SP).
Edinger passou uma semana
hospedado no Juqueri e mais oito
circulando entre os pacientes.
Em 1990, suas fotos fizeram sucesso na extinta galeria Fotoptica
e, em 1992, foram revelação do
Festival de Perpignan, França,
com prêmio de US$ 10 mil.
Edinger disse que a loucura é um
mal que chega ao século 21 sem solução. "Ninguém sabe o que fazer
com os loucos, a não ser drogá-los, o que não lhes devolve a
consciência, mas os mantém calmos." Leia abaixo os principais
trechos de sua entrevista.
Folha - Quais os motivos que o
levaram a fotografar no Juqueri?
Claudio Edinger - É um assunto
que sempre esteve em pauta comigo, consciente ou inconscientemente. O primeiro trabalho fotográfico que fiz foi sobre o edifício
Martinelli, um prédio esquizofrênico, em São Paulo, em 1975.
Na época, era suntuoso, um dos
primeiros prédios de luxo construídos na cidade. Por dentro, era
um cortiço incrível, onde o elevador só funcionava em cinco dos 30
andares. Se alguém morasse no
17º, tinha que pegar o elevador até
o 20º e descia três andares a pé.
Depois morei dois anos com os
judeus ortodoxos no Brooklyn,
em Nova York, para fotografá-los.
Loucura?
Certos dias eles não podem andar de carro, de elevador, não podem acender o fogão ou destacar o
papel higiênico. Não têm TV,
usam roupas esquisitas, homem
dança com homem, mulher com
mulher, imagine só.
Depois fui ao Chelsea Hotel, um
reduto pirado do underground
americano.
Daí, fui ao Venice Beach, uma espécie de hotel Chelsea horizontal
californiano.
Com minha avó querida de cama, incapaz de me reconhecer, o
choque de seu estado acabou me
levando ao estudo fotográfico do
lado extremo da loucura. A partir
disso, fotografar o Juqueri foi um
passo inevitável.
Folha - O sr. entendeu a loucura?
Edinger - Hoje, talvez eu entenda um pouquinho mais. A loucura
é um assunto supercomplexo. Vejo no doente mental um espelho. E
é duro conseguir se enxergar em
um espelho, admitir que aquilo
que vemos somos nós.
Folha- Suas fotos têm uma aura
de paz e calma. O Juqueri se apresenta dessa forma?
Edinger - A calma é ilusória.
Nas fotos, a tensão é uma corrente
subterrânea por trás da aparente
calma. O que funciona nelas é esse
equilíbrio momentâneo entre a
calma e a tensão. Está no olhar,
nos gestos, na linguagem do corpo. Se acabar o efeito das drogas
que acalmam, já viu...
Folha - O livro pode ser considerado um alerta para a sociedade?
Edinger - A perenidade de um
livro é muito sedutora. Se ele não
servir para nada agora, em cem ou
200 anos talvez sirva. Ou não.
Se esse livro em particular é uma
contribuição à sociedade, não sei.
Espero que sim. Até pelo fato de
que muitas pessoas não conseguem olhar para as fotos. Gostaria
de pensar que não é um alerta, mas
um lembrete. "Olha, estamos
aqui, não esqueçam da gente, podia ser qualquer um de vocês."
Livro: Loucura
Lançamento: DBA
Onde encontrar: Livraria Spiro (alameda
Lorena, 1.979, tel. 011/853-8855, Jardins)
Quanto: R$ 35 (72 págs)
Patrocinador: Interpa Social Cheque
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