São Paulo, Segunda-feira, 12 de Julho de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

"São tantos livros, fiz tudo o que pude fazer", diz escritora, cuja adaptação do romance "O Caderno Rosa de Lori Lamby", dirigida por Bete Coelho, está em cartaz em SP
Hilda Hilst, 69, pára de escrever: "Está tudo lá" MARILENE FELINTO
da Equipe de Articulistas


Hilda Hilst não escreve mais. A personalidade mais dionisíaca da literatura brasileira dá por encerrada sua missão na Terra, planeta em que não sabe por que nasceu.
"São tantos livros, 40 livros, eu fiz tudo o que pude fazer", ela disse à Folha em Campinas (SP), no sítio onde vive e também onde falou sobre a adaptação para o palco de seu romance "O Caderno Rosa de Lori Lamby", atualmente em cartaz em São Paulo (leia texto ao lado).
Obcecada pela lembrança do pai -o poeta e fazendeiro paulista Apolonio de Almeida Prado Hilst, que enlouqueceu aos 38 anos, quando Hilda era menina-, pelo sexo, pela beleza e loucura, ela escreveu uma espécie de "Kama Sutra" existencial ao longo de meio século de literatura.
Estreou em 1950, com o volume de poemas "Presságio". De lá para cá, sua obra alternou momentos bons e regulares, transitando pelos três gêneros literários.
Seus melhores textos como prosadora estão nas narrativas cujo tema são o sexo, o corpo, o gozo. É o que se verifica desde "A Obscena Senhora D" (82) ou "Matamoros" (86) à trilogia de fundo erótico que popularizou o nome da escritora: "Contos D'Escárnio - Textos Grotescos", "Cartas de Um Sedutor" e "O Caderno Rosa de Lori Lamby" (90-91).
Parte da prosa de Hilst se perde, no entanto, em herméticos exercícios de experimentalismo. É o caso das novelas "Qadós", "Fluxofloema" ou "Axelrod".
A escritora atribui o hermetismo ao ponto e vírgula. "A nossa língua tem isso de latim e grego, não é?", comenta. "Se a gente muda uma vírgula, já fica tudo atrapalhado, a pessoa já não entende. Parece que tem a ver com a minha pontuação. Como eu nunca uso ponto e vírgula, não faço aquelas coisas formais, as pessoas têm dificuldade de ler."
As frequentes montagens teatrais de sua prosa não confirmam, porém, a dificuldade. É o caso de "Cartas de Um Sedutor" (montada em 95 por Marcus Vinícius de Arruda Camargo) e "A Obscena Senhora D" (94, montagem de Vera Fajardo).
Fisicamente abatida, Hilda Hilst ainda fuma e bebe "vinho do Porto, todo dia". Teve vida intensa na sua juventude de moça rica e avançada para os padrões da época e de sua classe social.
"Dizem que a minha literatura é muito obscena. Aí eu já falo para a pessoa: "Obscenos são teus amigos" e tal, e começo a ser bem desagradável, porque eu posso ser muito desagradável", informa.


Texto Anterior: Programação de TV
Próximo Texto: Monólogo tem Iara Jamra
Índice

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.