São Paulo, sábado, 12 de setembro de 1998

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MEMÓRIA
Agonia do mestre Kurosawa era antiga

do enviado a Veneza

Menos um mestre vivo do cinema, mais uma lenda para cultuar e esquecer com o tempo. O impacto da morte do genial Akira Kurosawa, desgraçadamente, é perene. O mestre agonizava fazia tempo. Não do mal da velhice, prevista e ensaiada em inúmeros de seus clássicos, mas do mal do ostracismo. Do abandono em vida. Fui ao Japão atrás de Kurosawa em 96, assim como fora a Roma dez anos antes atrás de Fellini, outro gênio abandonado pela indústria do cinema e pelo público. O motivo era o mesmo: pedir a ele a cessão de um de seus maravilhosos desenhos a fim de comemorar os 20 anos da Mostra Internacional de Cinema em São Paulo. O primeiro encontro para discutir o assunto -e não poderia ser melhor- foi marcado num minúsculo bar chamado "La Jette", em homenagem ao curta homônimo do francês Chris Marker. A interlocutora foi uma antiga colaboradora do mestre. A visita a Kurosawa ("que seria bem formal", já me haviam explicado) esteve bem perto de acontecer. Sua debilitada saúde havia piorado naquela semana de abril de 96 em consequência de uma queda do velho mestre em sua própria casa, quebrando duas costelas. Mesmo assim seus desenhos foram colocados à disposição da mostra, todos da sua safra para o filme anterior, "Sonhos". A disposição de trabalhar continuava inabalada, diziam-me seus colaboradores. Kurosawa preparava um "remake" de seu próprio filme "Barba Ruiva", de 1965. A gloriosa carreira de Akira Kurosawa será encerrada pela lembrança desse filme em preto-e-branco que ele não refez. (LC)


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