São Paulo, sexta-feira, 12 de outubro de 2001

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CINEMA/ESTRÉIA

"OS QUERIDINHOS DA AMÉRICA"

Comédia romântica dirigida por Joe Roth foi feita para o público de Julia Roberts

Sátira desnatura-se em autocelebração

TIAGO MATA MACHADO
CRÍTICO DA FOLHA

A única cena boa de "Os Queridinhos da América" é aquela em que Julia Roberts e John Cusack acordam, depois de uma noite de amor, e conversam tapando a boca com os lençóis para não contaminar o ambiente com o seu mau hálito matinal.
Essa cena vai contra uma extensa e incompreensível tradição hollywoodiana: a dos beijos matinais apaixonados, cenas de amor que desconhecem, em seu romantismo, o mau hálito e o mau humor comuns a qualquer despertar (a falta de glamour, enfim).
De resto, o filme de Joe Roth, sério candidato a pior do ano, permanece fiel a uma das tradições mais inglórias de Hollywood: a das pseudo-auto-sátiras. Não que Hollywood seja incapaz de uma autocrítica. Vincent Minnelli (com "Assim Estava Escrito" e "A Cidade dos Desiludidos") e Billy Wilder ("Crepúsculo dos Deuses") já conseguiram, mas seus filmes são a exceção que confirma uma regra segundo a qual toda autocrítica acaba se desnaturando em autocelebração.
"Os Queridinhos da América" começa prometendo flagrar a realidade dos bastidores da indústria e acaba se revelando mais uma comédia romântica ao gosto do público cativo de Julia Roberts. O potencial crítico do filme equivale ao de uma revista de fofocas: não há sátira aqui, apenas a revelação de um previsível amontoado de segredos íntimos e profissionais.
O hiato existente entre a imagem pública dos astros e sua vida privada é o mote do roteiro burocrático de Billy Crystal e Peter Tolan. A dupla vai na contramão do clássico de Wilder, "Crepúsculo dos Deuses", a maior sátira que Hollywood fez a si mesma.
Se seguisse o mote de Wilder, o filme de Roth deveria ser protagonizado por Tom Cruise e Nicole Kidman e trazer, no papel do espanhol, Antonio Banderas (seu verdadeiro modelo) ou Penélope Cruz, a suposta nova namorada de Cruise.
Billy Cristal faz o assessor de imprensa encarregado de juntar o recém-separado casal "queridinho da América", Gwen (Catherine Zeta-Jones) e Eddie (John Cusack), para a estréia do mais recente filme da dupla, dirigido por um cineasta excêntrico (Christopher Walken) ao estilo Kubrick. Os traumas de Eddie, o bofe espanhol de Gwen e a paixão da irmã e assistente desta, Kiki (Roberts), pelo antigo cunhado prometem complicar a tarefa.
Protagonista, roteirista e produtor do filme, Crystal é o maior responsável por essa bomba. Nada é pior, em cinema, do que uma sátira malfadada e pior do que uma bem-sucedida.


Os Queridinhos da América
America's Sweethearts
Direção: Joe Roth
Produção: EUA, 2001
Com: Julia Roberts, Billy Crystal, Catherine Zeta-Jones, John Cusack
Quando: a partir de hoje nos cines Anália Franco, Belas Artes, Center Norte, Ibirapuera, Interlagos, Lapa, Pátio Higienópolis, Shopping D e circuito




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