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CINEMA/ESTRÉIAS
"A ESPINHA DO DIABO"
Terceiro trabalho do mexicano Guillermo del Toro é produção de Pedro e Agustín Almodóvar
Filme de horror faz metáfora de guerra
DA REPORTAGEM LOCAL
"É um filme com fantasma, não
de fantasma. Trata da violência e
da falta de entendimento", diz o
diretor mexicano Guillermo del
Toro, 36, ao falar à Folha sobre "A
Espinha do Diabo", seu terceiro
filme, que chega agora ao Brasil.
Contar a história de um orfanato assombrado pelo fantasma de
um menino, Santi, que nele morreu de forma sangrenta, foi o modo que Del Toro, autor de "Cronos" (93) e de "Mutações" (97),
escolheu para falar dos horrores,
bastante mais terrenos, da guerra.
O resultado é cru. Del Toro não
tem o menor pudor em matar
criancinhas. "Para fazer concessões existe o cinema americano",
diz. "Num filme de guerra com
crianças é inevitável alguma brutalidade. A vida real é bem pior."
"Mesmo quando o conflito acaba", diz Del Toro, "deixa atrás de
si tristeza e fantasmas, arranca vidas, destrói memórias, destroça
famílias". No filme, explica, pretendeu reproduzir, no microcosmo do orfanato, a Guerra Civil Espanhola (1936-1939).
"São quatro paredes perdidas
em meio ao nada, uma metáfora
da Espanha, protegida por uma
instituição republicana leal atacada por um fascismo raivoso e jovem", como o personagem de Jacinto, bedel da instituição e principal pavor dos órfãos.
Para ele, a luta contra o franquismo lhe pareceu a situação
histórica "mais apropriada" para
o filme. "Ela prefigura a Segunda
Guerra Mundial e, assim, se torna
uma espécie de fantasma para toda a Europa. Além disso, a Espanha ficou isolada, sem ter quem a
ajudasse", conta, reforçando a
metáfora.
Com o título, Del Toro lança outra comparação. A espinha do
diabo é, na verdade, a espinha bífida (anomalia fetal causada por
baixo consumo de ácido fólico pela gestante). As causas da doença
eram desconhecidas no momento
retratado no filme.
A menção à anomalia é "rápida,
porém profunda", afirma Del Toro. "O personagem diz que é algo
que acontece aos filhos de ninguém, aos que não deveriam ter
nascido. E, no fim, não é nada
mais que doença e pobreza. Como a guerra, que destrói as crianças antes que cresçam."
Para ressaltar sua convicção de
que a violência não é solução,
mesmo quando está do lado do
mocinho, Del Toro conta que tentou fugir do maniqueísmo, do
aplauso quando morre o "malvado" -coisa que, acha, jamais poderia fazer em Hollywood.
"A liberdade não é natural na
indústria do cinema americano;
há que conquistá-la", diz o cineasta, falando justamente de Los Angeles. Era lá que, depois da produção bancada pelos irmãos Almodóvar, finalizava seu quarto trabalho, o "filme de encomenda"
"Blade 2".
(FRANCESCA ANGIOLILLO)
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