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CINEMA
Convidada do 2º Amazonas Film Festival, antiga musa do cinema italiano relembra parcerias com Visconti e Herzog
"Todos os que amei não estão mais aqui", diz Cardinale
SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL A MANAUS
Pela segunda vez, a atriz italiana
Claudia Cardinale, 67, vai embora
da Amazônia pensando em voltar. "Acho que ainda venho outra
vez", disse a um teatro Amazonas
que a aplaudia de pé. A atriz foi
homenageada em Manaus pelo 2º
Amazonas Film Festival, que terminou na última quinta.
O longa "Fitzcarraldo", que ela
filmou na região com Werner
Herzog em 1982, foi exibido na
mostra. Mas foi um curto e caseiro vídeo com trechos de outros filmes seus que mais a emocionou.
"Eu me dei conta de que todas as
pessoas que amei não estão mais
aqui." Apesar disso, a atriz se
comportou como a mais alegre
das criaturas. Sempre sorrindo,
conversou com todos que se
aproximaram e não rejeitou convites para passear na selva nem
para se esbaldar na pista de dança,
ao lado de um grupo de folclore.
Na última terça, ao atravessar o
rio Negro de barco, Cardinale falou à Folha. Leia a entrevista.
Folha - A sra. parece ser uma pessoa muito feliz. Como conseguiu
atingir a felicidade?
Claudia Cardinale - Nessa profissão, você tem de ser muito forte
interiormente. Do contrário, é devorada; é um ambiente canibalesco. E você perde sua identidade,
perde a cabeça e se considera uma
diva. Para seguir essa profissão, é
preciso ser muito forte e distinguir entre o seu trabalho e a sua
vida. Eu sempre fiz essa distinção.
Folha - A sra. se referiu ao ator
Klaus Kinski, com quem contracenou em "Fitzcarraldo", como "louco". Qual sua principal memória
das filmagens na Amazônia?
Cardinale - O cinema é aventura,
e "Fitzcarraldo" é o verdadeiro cinema da total aventura. Isso significa que foi de uma dificuldade extrema. Éramos poucos no set. Tivemos muitos problemas. O filme
começou com [o ator] Jason Robards [1922-2000], mas ele era
muito frágil e perdeu a cabeça. Interrompemos o filme e recomeçamos com Klaus Kinski. Ele era totalmente louco. Mas Herzog é um
homem que adora as coisas impossíveis. Também gosto disso.
Folha - É o gosto da aventura que
a trouxe de volta à Amazônia?
Cardinale - Quis voltar porque
adoro a natureza e a Amazônia.
Acho interessante que o mundo
fale sobre essa região, e o festival é
importante para isso. Por isso
vim.
Folha - Qual é a principal mudança no cinema desde o início de sua
carreira até hoje?
Cardinale - Antes era a arte, agora é business. Para mim isso é
muito difícil porque fui uma pessoa privilegiada -filmei com os
maiores cineastas do mundo.
Agora é difícil que eu aceite fazer
um filme porque eu sinto: eu sou
um animal [cinematográfico].
Folha - Não há mais cineastas
com quem a sra. queira filmar?
Cardinale - Não sei. Eu nunca telefonei para nenhum cineasta.
Sempre fui escolhida por eles.
Folha - Entre os grandes mestres
com quem a sra. trabalhou, qual é o
seu favorito?
Cardinale - Existem muitos, mas
o ponto alto da minha vida foi o
encontro com [Luchino] Visconti
[1906-1976]. Era um mestre, foi
mágico, o encontro fatal, que me
ensinou muita coisa.
Folha - Que sensação a sra. teve
ao ver o vídeo com trechos de sua
carreira?
Cardinale - Foi muito emocionante porque eu me dei conta de
que todas as pessoas que amei
não estão mais aqui. É triste. Elas
partiram. É duro. Por exemplo,
em "Era uma Vez no Oeste" todos
partiram -cineasta, ator, não há
mais ninguém. Tenho saudades
de muitos diretores, como [Federico] Fellini [1920-93], Visconti,
[Mauro] Bolognini [1922-2001], e
também de atores com quem trabalhei, como Burt Lancaster
[1913-94], John Wayne [1907-79]
e Rita Hayworth [1918-87].
Folha - A sra. conhece algo da
produção recente de filmes da
América do Sul?
Cardinale - Muito pouco, porque
os filmes não viajam o suficiente
pelo mundo. Mesmo em Paris,
hoje, não se vê quase nada do cinema italiano, que, no entanto,
está ali do lado. Imagine como é
com o cinema da América do Sul,
ainda mais difícil. Acho que é preciso voltar a fazer como era antes,
quando os filmes estreavam no
mundo todo porque eram co-produções entre muitos países.
Folha - A uma diva é indispensável perguntar: qual é seu segredo
de beleza?
Cardinale - Nunca fiz lifting. Tenho uma vida saudável. Como
pouco e faço ginástica. Ou então
caminho muito. E amo a vida.
A jornalista Silvana Arantes viajou a convite do 2º Amazonas Film Festival
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