São Paulo, quinta, 12 de novembro de 1998

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Moma - Cinema brasileiro para americano ver

Divulgação
Bruno Campos e Glória Pires em cena de "O Quadrilho" (1995) de Fábio Barreto, um dos destaques da mostra de cienam promovida pelo Moma



Começa hoje no museu nova-iorquino a retrospectiva "Cinema Novo and Beyond", que reúne um total de 61 longas e 17 curtas nacionais rodados entre 1961 e 1998


AMIR LABAKI
de Nova York

Uma projeção para convidados do thriller político "Ação entre Amigos", de Beto Brant, seguida de um jantar, inaugura na noite de hoje, no Museu de Arte Moderna de Nova York, a retrospectiva "Cinema Novo and Beyond" (Cinema Novo e Depois). Organizada pelo museu norte-americano e pelo Ministério da Cultura brasileiro, o ciclo reúne um total de 61 longas e 17 curtas, rodados entre 1961 e 1998, em cópias majoritariamente novas, preparadas pela Cinemateca Brasileira, legendadas em inglês. Dois longas-metragens foram adicionados à lista, originalmente revelada com exclusividade pela Folha. A ausência então criticada de qualquer obra do cineasta paulista Ugo Giorgetti levou pessoalmente o ministro da Cultura, Francisco Weffort, a solicitar a inclusão de "Boleiros".
Já "Ação entre Amigos" foi escolhido para substituir na abertura para convidados o longa "O Primeiro Dia", de Walter Salles e Daniela Thomas, cuja exibição foi cancelada a pedido da distribuidora americana Sony, ao adquirir os direitos para seu lançamento nos Estados Unidos.
Com o convite para "Ação entre Amigos", Brant emplacou na mostra os dois longas-metragens pôr ele dirigidos. "Matadores" já havia sido previamente selecionado. Aos 34 anos, é ele o mais jovem cineasta representado.
² Curadoria
A curadoria da mostra foi coordenada pôr Jytte Jensen, do departamento de cinema e vídeo do MoMA. O professor da Escola de Comunicações e Artes da USP Ismail Xavier e o diretor-geral da Riofilme, José Carlos Avellar, funcionaram como curadores brasileiros.
A lista de selecionados é coerente, mas elitista. Filmes de diálogo mais amplo com o público foram deixados de lado. Privilegiou-se a produção cinemanovista ("câmera na mão, idéia na cabeça") e a de seus herdeiros.
Oito cineastas tiveram escolhidos mais de um de seus filmes. Os quatro que emplacaram três filmes (Glauber Rocha, Joaquim Pedro de Andrade, Leon Hirszman e Nelson Pereira dos Santos) são protagonistas do cinema novo, assim como dois dos que tiveram dois filmes selecionados (o também jornalista e colunista da Folha Arnaldo Jabor e Carlos Diegues).
Com esse recorte nítido, o conjunto reúne uma seleção que é forte, mas poderia ser mais pluralista. A diversidade do cinema brasileiro contemporâneo deveria ter sido melhor representada naquela que é, afinal, a principal mostra internacional a ele dedicada desde a histórica retrospectiva no Centro Georges Pompidou, em Paris, há exatos 11 anos.
Mesmo um sintético balanço das ausências revela lacunas importantes. Não se pode falar do cinema brasileiro dos anos 60 sem lembrar a coragem de "Os Cafajestes", de Ruy Guerra, o lirismo de "Todas as Mulheres do Mundo", de Domingos de Oliveira, ou a contundente denúncia antitortura de "O Caso dos Irmãos Naves", de Luiz Sérgio Person.
O bressoniano "Ato de Violência", de Eduardo Escorel, inspirado na história do assassino serial Chico Picadinho, é o grande ausente dos anos 70.
² Omissões
As omissões são ainda mais graves entre os chamados filmes da "abertura": "Pra Frente Brasil", de Roberto Farias, e "Jango", de Sílvio Tendler, marcaram época como poucos.
"A Dama do Cine Shanghai", de Guilherme de Almeida Prado, é o mais emblemático representante da escola metacinematográfica que marcou nos anos 80 o chamado novo cinema paulista. Também ficou de fora.
O maior escândalo, porém, é a exclusão de "Carlota Joaquina, Princesa do Brazil", de Carla Camurati. Restrições estéticas à parte, "Carlota" marca o relançamento do cinema no Brasil após o colapso da era Collor.
Sua ausência frisa o preconceito anticomercial das seleção, única explicação possível para a omissão de outros protagonistas tão importantes do filme brasileiro nos últimos 40 anos, como os Trapalhões, José Mojica Marins (o Zé do Caixão) e um cineasta com talento para o épico histórico como Sérgio Rezende ("O Homem da Capa Preta", "Canudos").
O mesmo viés cinemanovista da seleção de longas-metragens marca a de curtas. O documentário curto impera, relegando a segundo plano o principal fenômeno do formato nos últimos 15 anos: a ascensão do curta de ficção. A lista do MoMA simplesmente não espelha a história do curta brasileiro no período.



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