São Paulo, sábado, 13 de abril de 2002 |
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LIVRO/LANÇAMENTO A cultura da mordaça
DA REPORTAGEM LOCAL Nem Peter Pan escapou dos aparatos de censura brasileiros. É, até mesmo o personagem que não queria crescer, criado pelo inglês J.M. Barrie e apadrinhado pelos traços de Disney, foi perseguido pela repressão de Getúlio Vargas. A história de como os livros com a versão dessa história feita por Monteiro Lobato foram apreendidos pela Superintendência de Segurança Política e Social de GV é um dos exemplos reunidos em "Minorias Silenciadas" de até onde pode chegar a censura. O artigo "Procura-se Peter Pan", de Vladimir Sacchetta e Marcia Mascarenhas Camargos, mostra como a manifestação de idéias contrárias ao regime podia levar um intelectual como Lobato (de quem os pesquisadores fizeram a biografia "Um Furacão na Botocundia") a seguidas visitas ao interior da Casa de Detenção. A história, na verdade, começou bem antes dos "era uma vez" lobatianos, mostra o livro. Foi em 1517, com o Brasil ainda adolescente, que nasceram nossas primeiras regras de censura. Nesse ano, os portugueses começam a montar o tripé institucional que regulamentaria a censura na metrópole (e consequentemente na colônia) até 1768. A estrutura era formada por um tribunal de juízes eclesiásticos, denominado Ordinário, pelos representantes do Estado absolutista, instituição chamada de Mesa do Desembargo do Paço, e pelo Santo Ofício da Inquisição (que começa oficialmente em Portugal em 1536 e só é extinta em 1821). Nesses primeiros séculos, tanto no Brasil quanto em Portugal, a censura seguia ditames religiosos (e de quebra amordaçava grandes literatos como Gil Vicente e até Camões). "O argumento usado para apreender e queimar livros é que eles feriam a verdadeira fé católica. É uma luta contra o herege, o inimigo número um deles", diz Maria Luiza Tucci Carneiro. De acordo com a organizadora de "Minorias Silenciadas", a repressão só começaria a mudar de ritmo com a ascensão do marquês de Pombal ao poder português. Em 1768 o todo-poderoso ministro do rei dom José 1º cria a Real Mesa Censória, instituição formada por leigos e religiosos que passou a regulamentar as perseguições oficiais. "A censura ganha um tom político. Persegue não mais o cristão-novo, mas os maçons, que representavam a trama de algo secreto contra o governo, os teóricos da Ilustração, como Voltaire, e os jesuítas, grandes inimigos de Pombal." Essa nova censura, mais política do que religiosa, se estenderia ao Brasil, que só deixou de espelhar as práticas censoriais portuguesas depois de 1808, com a abertura dos portos e o nascimento oficial da imprensa no país. Os próximos grandes capítulos da história da mordaça no Brasil viriam junto aos grandes acontecimentos nacionais. Exemplo: o artigo "Sob o Signo da Censura", da historiadora Ana Luiza Martins, mostra como um mês depois da Proclamação da República, em 1889, já existe um decreto restringindo a atuação da imprensa. "Havia um medo muito grande da revanche dos monarquistas." Outro momento de destaque nessa linha do tempo seria 1923. Nesse ano é decretada a chamada Lei Adolfo Gordo (que leva o nome do senador paulista). Mecanismo de cerceamento da atuação da imprensa, a lei tinha como alvo principal os anarquistas e comunistas (e o PCB havia nascido só dois anos antes). Os comunistas continuariam a ser perseguidos até 1983. (CASSIANO ELEK MACHADO) Texto Anterior: A história do silêncio involuntário brasileiro Próximo Texto: "Livros Proibidos" ganha reedição Índice |
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