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Música
Crítica/"Baden Plays Vinicius"
Baden Powell troca força por lirismo em grande álbum
Violonista dissecou parcerias com Vinicius em gravação pouco antes de morrer
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
É pena que o CD "Lembranças", o último gravado por Baden Powell,
já esteja fora de catálogo. Ele
forma um par perfeito com
"Baden Plays Vinicius", feito
um mês antes, em abril de
2000, e só agora lançado no
Brasil, após edições no Japão e
na França.
Em "Lembranças", Baden
dedicou apenas duas das 11 faixas à sua própria obra, priorizando um inventário de composições que marcaram sua infância: "Pastorinhas", "Molambo" (de seu professor Jayme
Florence, o Meira) e "Dora".
Conscientemente ou não,
ele, que enfrentava problemas
de saúde e morreria quatro meses depois, aos 67 anos, realizou
de maneira extremamente delicada, sem a força característica de sua mão direita, um retorno ao momento em que tudo
começou.
Já em "Plays Vinicius", o repertório são oito criações suas
com seu maior parceiro, mas
interpretadas da mesma maneira suave -e só em versão
instrumental, tornando o título
meio estranho, já que seria
mais apropriado se chamar
"Baden Plays Baden".
Um caso exemplar é o de
"Apelo". Embora belíssimo, o
samba foi ficando, com o passar
das gravações, um tanto gasto,
o seu crescendo servindo de estímulo para exibições exageradas de cordas vocais -solo ou, o
que é freqüentemente pior, em
coro.
Já nessa última versão, Baden mostra o esqueleto da música, dissecada das gorduras
acumuladas ao longo do tempo,
e faz um registro ainda mais
emocionado do que qualquer
outro, mesmo sem o apoio da
bela letra de Vinicius. A dissecação é tal que o samba se torna
praticamente uma valsa, pois
perde parte de sua síncopa em
prol da revelação de sua grandeza melódica.
Guardadas as diferenças,
pois cada tema ou interpretação de Baden é uma pirâmide
(dada a quantidade de camadas
que tem), ele faz abordagens semelhantes em "Consolação",
"Samba em Prelúdio" e "Deixa". Não são (apenas) os sambas marcantes aquilo que se
ouve, mas toda uma história de
vida e de música, que passa por
Bach, pelo choro e por outras
referências.
No "Samba da Benção", o violonista, que tinha trocado os
cultos afro-brasileiros pela fé
cristã e parado de tocar "Berimbau" e outros afro-sambas,
parece querer afastar um pouco a melodia dos terreiros, mas
a pulsação é negra, apenas
apontando outros e igualmente
belos caminhos.
O Baden deste CD, em suma,
não tem o violão dobrado (como se fossem duas pessoas tocando) e intenso que o tornou o
maior violonista popular brasileiro. É um Baden lírico, mais
contido, e ainda imenso.
A emoção aumenta ao saber
que tudo foi gravado em um
único dia, 13 de abril de 2000
-e registrado pelo produtor
Armando Pittigliani. Resta agora, na celebração dos 70 anos de
Baden, a gravadora Trama relançar "Lembranças".
BADEN PLAYS VINICIUS
Gravadora: Deckdisc
Quanto: R$ 23, em média
Avaliação: ótimo
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