São Paulo, quarta-feira, 13 de julho de 2011

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9ª FESTA LITERÁRIA INTERNACIONAL DE PARATY

"Não cabe a mim, como curador, criticar mesas da Flip"

Manuel da Costa Pinto responde à polêmica depois de ter chamado de anti-intelectual atitude de Claude Lanzmann

MANUEL DA COSTA PINTO
COLUNISTA DA FOLHA

Ao se recusar a responder às perguntas de Márcio Seligmann-Silva sobre o filme "Shoah", na mesa "A Ética da Representação", o francês Claude Lanzmann alegou que o mediador se desviava do tema principal: seu livro de memórias "A Lebre da Patagônia" (Cia. das Letras).
Ocorre que a filmagem de "Shoah" levou 12 anos e ocupa os últimos capítulos do livro. Nada mais natural que fosse o centro do debate.
O motivo da recusa foi outro. Lanzmann se irritou quando Seligmann-Silva fez menção a Didi-Huberman (filósofo que polemizou com o autor de "Shoah") e ameaçou se retirar de cena, desqualificando um mediador que escreveu vários ensaios sobre o tema (incluindo reflexões sobre o próprio Lanzmann).
Na coletiva de imprensa da Flip, expressei minha decepção ao constatar que um intelectual que sucedeu Sartre à frente da revista "Les Temps Modernes" e que havia lutado na resistência ao nazismo -uma ideologia irracionalista e um regime que baniu artistas e intelectuais- também adotasse postura anti-intelectual.
Foi o suficiente para que se fizesse a ilação de que qualificara a atitude de Lanzmann de nazista, com manchetes ligeiramente sensacionalistas, seguidas de textos que, reconheço com satisfação, nuançaram e contextualizaram minhas declarações.
Todo nazista é anti-intelectual, mas nem todo anti-intelectual é nazista -o raciocínio é tão elementar quanto seria absurdo associar ao nazismo um judeu que, em "Shoah", engajou sua notável trajetória na restituição da memória dos campos de extermínio.
Menos elementar é compreender as razões que levam o intelectual Claude Lanzmann a reivindicar um ponto de vista que exclui todas as outras formas de representar e interpretar o horror. Seria importante saber por que Lanzmann considera "obscena" e "revisionista" qualquer tentativa de explicação da catástrofe ("shoah", em hebraico).
Não cabe a mim, como curador, criticar as mesas da 9ª edição da Flip.
Na entrevista coletiva, atuei como jornalista que já se dedicou inúmeras vezes ao tema (incluindo um dossiê sobre "Literatura de Testemunho" feito para a revista "Cult" em parceria com Seligmann-Silva).
Minha expectativa pela presença de Lanzmann, seguida da frustração pelo que ocorreu, acabaram precipitando uma perplexidade diante das reações negativas de parte minoritária do público (com endosso da mídia) a discussões que não podem se furtar à complexidade, que são taxadas de "acadêmicas", também desqualificando a reflexão.


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