São Paulo, quinta-feira, 13 de agosto de 2009

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Opinião

Gramado começou a perder espaço na era Collor

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Nos seus dias de glória, Gramado dividia com Brasília as honras de principal festival de cinema brasileiro. A Embrafilme, a empresa estatal de produção e distribuição, era quem comandava a festa, de tal modo que um dos festivais pontificava sobre o primeiro semestre, ficando o segundo para o outro.
Acontece que Gramado é uma cidade pequena, aprazível, na montanha, enquanto Brasília é uma capital grande, dispersiva, sem charme. Ao menos era assim que as coisas eram vistas. Enquanto em Brasília comia-se quase todo o tempo no hotel, em Gramado havia inúmeras opções de refeição. Enquanto em Brasília as pessoas transitavam entre o hotel e o cinema, em Gramado faziam passeios pelos arredores.
Gramado tinha como força suplementar a cinefilia sulina, alimentada por críticos como P.F. Gastal e Goida. Ela gerou, entre os anos 1970 e 1980 o surgimento de uma jovem geração de cineastas que demonstravam muito talento (embora, na maior parte das vezes, não tenham obtido meios para firmar-se). No mais, interessava ao governo do Rio Grande do Sul promover a cidade como centro turístico, o que não ocorria aos governos do Distrito Federal.
O vento soprou, assim, a favor de Gramado até 1990, quando o governo Collor fechou a Embrafilme e provocou a maior crise de produção do cinema brasileiro desde o fechamento da Vera Cruz, nos anos 50 do século 20. Sem filmes brasileiros à disposição, Gramado optou por mesclar os poucos filmes brasileiros que havia com filmes de outros países latinos.
Aí começa a decadência. Como festival latino ou latino-americano, Gramado nunca passou de um evento secundário. Mudanças de direção, determinadas por mudanças políticas, também não ajudaram. Aos poucos, Gramado passou à condição de segundo festival, deixando a Brasília a incontestável primazia. Aos poucos, outros festivais se destacaram.
Recife traz o calor do Nordeste (em mais de um sentido) e já começa a trazer atrações internacionais. Paulínia dispõe-se a premiar regiamente quem se dispuser a enfrentar seus modos novos ricos, que preveem até sessões de gala. O espaço de Gramado estreitou-se dramaticamente, o que é pena. Recuperá-lo exigiria um tanto de sorte e a atenção e investimento que sucessivos governos sulistas aparentemente não quiseram, ou não souberam, fazer.


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