São Paulo, Segunda-feira, 13 de Setembro de 1999
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Francês faz relato de maus-tratos na Argélia

LUIZ ANTONIO DEL TEDESCO
Editor-assistente da Ilustrada

Mudam os países, as épocas e (um pouco) as razões, mas os métodos de tortura e o universo que se forma em torno dela parecem ser os mesmos.
Henri Alleg, 79, conhece esse ambiente de perto. Francês, jornalista, Alleg era diretor do "Alger Républicain" na época em que começaram os confrontos na capital argelina pela independência do país (1954). O jornal, em língua francesa, era o único pró-independência e denunciava a repressão e casos de tortura na Argélia -colônia francesa desde 1830.
Alleg, que esteve na semana passada no Brasil para palestras em Porto Alegre, Campinas e Rio de Janeiro, foi preso em Argel em 56, após dois anos clandestino.
Passou três dias sendo torturado em um "centro de triagem" de um grupo de pára-quedistas do exército francês. Nada disse a seus algozes e ainda pedia para ser tratado de "senhor" (vous) e não de "você" (tu) pelos inquiridores.
"A tortura já existia na Argélia antes da guerra, mas de forma "artesanal". A guerra a trouxe à escala industrial", conta. "Os caminhões do exército saíam vazios no começo da noite e voltavam de madrugada, cheios de pessoas para serem "interrogadas"."
Afogamento, surras, solitária, choques elétricos e torturas psicológicas, Alleg passou por todos. Estão todos relatados em seu livro (o único sobre tortura que escreveu) "A Questão", de 57, um minidiário do que sofreu nos dias em que esteve no "centro de triagem". O livro saiu página por página da prisão em que Alleg permaneceu por três anos e meio em Argel. Foi publicado quando ainda estava preso. Sartre, Malraux, entre outros, o leram e pediram explicações ao presidente francês sobre a situação no país.
Se a tortura é vista como bom método para atingir objetivos, para Alleg, no caso da Argélia, ela não funcionou. "Muitas vezes, torturavam e matavam um pai em sua casa, na frente do filho ou da mulher. Se até então esse parente não se preocupava com a situação, começava a partir dali a lutar contra os franceses, que ganhavam mais um inimigo".


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