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"A câmera nunca consegue captar todo o sentimento"
Tailandês Weerasethakul diz que sempre sai frustrado de seus processos de criação
Diretor premiado em Cannes é homenageado em Buenos Aires em evento que também acontece em São Paulo
LUCAS NEVES
ENVIADO ESPECIAL A BUENOS AIRES
No canto da biblioteca do
museu portenho em que o cineasta Apichatpong Weerasethakul, 40, fala à Folha,
um ruído que parece vir dos
livros o intriga.
Entramos no mundo de
fantasia do tailandês, em que
princesas se entregam a bagres galanteadores e filhos
mortos visitam os pais em pele de macaco.
Seu cinema de tempos dilatados, paisagens sonoras e
contemplação paciente foi
reconhecido com o prêmio
máximo em Cannes e agora é
homenageado na capital argentina no Festival 4+1, que
acontece simultaneamente
em outras quatro cidades,
São Paulo incluída.
Apichatpong diz que sempre sai frustrado de seus processos de criação. "A câmera
nunca consegue captar todo
o sentimento." E o 3-D, diz,
não é remédio para essa incompletude. "Não acredito
nisso. O cinema é 2-D, achatado, e temos de aceitar isso,
tirar o máximo possível daí."
Em seu caso, isso significa
inscrever em duas dimensões histórias de fantasmas e
fábulas budistas que ouvia
na infância, sem deixar fora
do quadro os melodramas e
filmes de terror que marcaram sua formação. Para alguns, o resultado é de um
hermetismo inócuo. Mas não
peça explicações a ele: "Isso
me incomoda. Quando explico, acho que crio um muro,
um caminho de interpretação. Não quero destruir a magia, impor minha experiência. Alguns jornalistas dizem
que é difícil reportar sobre os
meus filmes. É difícil escrever sobre sentimentos".
Sentimentos cujo registro
ele compara a páginas de um
diário. "Fazer filmes é uma
performance. Em si, eles são
apenas uma documentação
disso. O prazer é filmar, imaginando como transmitir
sensações à plateia naquela
caverna moderna."
HOMEM E ÁGUA
Quando puser ponto final,
em 2011, na turnê mundial de
promoção de "Tio Boonmee
que se Lembra de Suas Vidas
Passadas" (premiado em
Cannes), Apichatpong vai rodar um curta para um canal
francês sobre o cotidiano de
um hotel ribeirinho. Será um
ensaio para o próximo longa.
No diário, guardará impressões acerca da relação
entre homem e água, tendo
como pano de fundo o rio
Mekong, no Sudeste asiático.
Também tem no baú o roteiro de "Ecstasy Garden"
(jardim do êxtase), em que
uma máquina ligada ao cérebro das pessoas as transporta
para realidades paralelas.
Acaba a entrevista. E o casal anglófono que passeava
pela loja de souvenirs fazendo falar os livros da biblioteca, do outro lado da parede,
nem suspeita da magia que
emprestou a Apichatpong.
O jornalista LUCAS NEVES viajou a convite
da organização do Festival 4+1
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