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"Sitcom" é tragédia de costumes
CRISTIAN AVELLO CANCINO
free-lance para a Folha
O pai passa
o tempo pesquisando as
"deformações
da raça" na virada do século; o filho, no meio de um
jantar em família, se anuncia
homossexual; a filha, Sofia,
fica paraplégica e se excita
dando porrada no namorado; a mãe se esforça em contemporizar. No epicentro
deles há um rato; na periferia de suas relações, uma
empregada espanhola, com
seu marido negro e homossexual, e o namorado de Sofia.
Eis o núcleo da família do
francês "Sitcom - Nossa Linda Família", de François
Ozon, uma comédia de humor negro que se inclina, à
primeira vista, sobre o tema
da desagregação familiar parodiando aquelas séries televisivas (sitcoms) que se configuram como relatos de
costumes.
Tudo parece ser circunstancial nesses universos domésticos-midiáticos, assim
como no criado por Ozon e
pelos excelentes atores do
elenco de "Sitcom". A família, como indica o senso comum, deveria nos prover da
sabedoria necessária para o
confronto com a vida coletiva, fundamentada hoje em
relações normatizadas cujo
liame é mantido, a duro custo, por anseios pecuniários,
interesses que não dizem
respeito ao afeto.
Na maioria das famílias há
a mãe, desinteressada, e o
pai, a primeira referência de
poder (como já enunciaram
Freud e Kafka), mas em "Sitcom" as referências se ausentam. O pai aconselha os
filhos com frases do tipo
"não se deve contar os pintos antes de os ovos chocarem" ou "a noite é a melhor
conselheira".
Jean, o pai, lê o conservador "Le Monde", fala pouco,
finge não ver o desajuste doméstico que se encaminha
gradativamente para a tragédia. No fundo, as situações
descontroladas do filme até
divertem, mas deixam um
bojo de inquietação, talvez
até por causa do desequilíbrio berrante dos personagens, da maneira natural como a tragédia se instala no
lar. Como diria Jean, o pai,
ao final da sessão: "É melhor
uma verdade do que duas
mentiras".
Avaliação:
Vídeo: Sitcom - Nossa Linda Família
Título original: Sitcom
Produção: França, 98
Distribuição: Cult Filmes
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