|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Cantor descobre Joaquim Nabuco
CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Escravidão e identidade nacional são os temas que dominam a
maioria das canções de "Noites
do Norte", o primeiro álbum com
composições inéditas de Caetano
Veloso desde "Livro" (97).
O cantor diz que não tinha noção de como seria o disco quando
entrou no estúdio. "Só pensava
nos sons: queria fazer experimentações com o modo de gravar a
voz com percussão", afirma Caetano, em "entrevista/release" divulgada anteontem pelo site Globo.com (www.globo.com).
A leitura casual de uma obra do
abolicionista Joaquim Nabuco
contagiou o compositor. Impressionado pelo estilo e pela atualidade da visão do pernambucano,
Caetano decidiu musicar um texto da autobiografia "Minha Formação", que caracteriza a escravidão como um traço nacional e duradouro do Brasil. Assim nasceu a
canção que dá título ao disco.
O tema da escravidão desdobra-se nas duas faixas seguintes. Em
arranjo de seu filho Moreno Veloso, Caetano resgata a figura da
princesa Isabel, no samba-de-roda "13 de Maio". Depois vem
"Zumbi", canção composta por
Jorge Ben ainda nos anos 70. "Um
caso espetacular de saúde cultural", elogia Caetano, homenageando mais uma vez o mestre do
samba-rock, cujas canções vem
gravando há décadas.
Outra homenagem, embora
carregada de ambiguidade, está
no rock "Rock'n'Raul". A letra de
Caetano, que toca na questão da
identidade nacional e do colonialismo cultural, descreve o irreverente roqueiro baiano como alguém com "uma vontade "fela-da-puta" de ser americano".
"Não desaprovo Raul, um dos
meus artistas favoritos", afirma
Caetano, observando que, apesar
de muitos de seus colegas de geração não terem essa mesma identificação com os norte-americanos,
"é difícil querer exigir que essa
vontade não apareça".
Um terceiro e último tributo incluído no disco já vem expresso
no próprio título da canção "Michelangelo Antonioni", que homenageia o cineasta.
"Tenho com o cinema italiano
uma dívida imensa, que venho
pagando pouco a pouco", explica
Caetano, que retoma nessa gravação o universo lírico de seu CD
lançado no ano passado, "Omaggio a Federico e Giulietta" -homenagem ao cineasta Federico
Fellini e à atriz Giulietta Masina.
Com participações de Lulu Santos e Zélia Duncan, no samba-reggae "Cobra Coral" (poema de
Waly Salomão musicado por Caetano), e de Dudu Nobre, tocando
cavaquinho, no samba-canção
"Meu Rio", "Noites do Norte" retoma também um hábito do Caetano dos anos 70: o de coordenar
pessoalmente as gravações, dispensando a colaboração de um
produtor. "Só que eu produzi
mais do que produzia naquela
época. Decidi mais como queria
que as coisas fossem. É um disco
mais meu, mais feito por mim."
Texto Anterior: Disco/lançamento: "Noites do Norte" faz voltar Caetano exilado do tempo Próximo Texto: Música: Jacob do Bandolim mostra sua economia de cordas Índice
|