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CINEMA
Cônsul israelense nos EUA manda relatório ao seu governo com restrições à obra de Spielberg sobre o massacre na Olimpíada de 72
Filme trata caso com "leviandade", diz Israel
DAVID M. HALBFINGER
DO "NEW YORK TIMES"
Funcionários do governo israelense se prepararam para o pior
quando foram informados de que
o cineasta Steven Spielberg tomaria a violência no Oriente Médio
por tema em "Munique", seu filme sobre o massacre nos Jogos
Olímpicos de 1972 e os assassinatos de terroristas palestinos ordenados como retaliação.
Mas a primeira resposta oficial
de Israel ao filme, que deve estrear
em 23 de dezembro nos Estados
Unidos (no Brasil, em 27 de janeiro), foi contida: a história não é favorável aos israelenses, mas isso
não importa muito.
"Trata-se de um filme de Hollywood", disse Ehud Danoch, o
cônsul-geral israelense em Los
Angeles, que compareceu a uma
sessão especial de "Munique".
Ainda assim, em um sinal de até
que ponto o filme estava sendo
tratado com seriedade, Danoch
disse que enviou um relatório aos
seus superiores em Jerusalém logo que a sessão acabou.
Danoch afirma que há muita
coisa que ele considera passível de
objeção no filme de duas horas e
meia, estrelado por Eric Bana como líder de uma equipe especial
de agentes do serviço secreto israelense, o Mossad, encarregada
pela primeira-ministra Golda
Meir de rastrear e matar os palestinos responsáveis pelo massacre,
no qual 11 atletas israelenses foram mortos.
A ordem da primeira-ministra
se estendia também a terroristas
que não estavam conectados ao
ataque. O cônsul disse que o filme
fazia parecer que a resposta de Israel isoladamente é que havia
causado uma escalada no terrorismo, algo que ele classifica como
pura ficção.
Danoch argumenta, acima de
tudo, que o filme propõe uma
equivalência moral injusta entre
os assassinos israelenses e seus alvos -tanto explicitamente, nos
diálogos em que os israelenses
questionam suas ações e os palestinos defendem as deles, quanto
de forma implícita, como quando
a câmera se move de um jornal televisivo que mostra os nomes dos
11 atletas israelenses mortos para
um funcionário do governo de Israel exibindo fotografias dos 11 alvos palestinos.
"E assim são 11 por 11", declarou
Danoch em entrevista no consulado. "É igual, é equilibrado, é isso
por aquilo. Mas de um lado temos
atletas olímpicos que foram assassinados da maneira mais horrorosa e repulsiva, e do outro lado
temos os homens que praticaram
o crime."
Leviandade
Danoch enfatizou que Israel jamais admitiu publicamente os assassinatos. Porta-vozes da Universal Pictures se recusaram a responder aos comentários de Danoch, dizendo que o filme fala por
si. Em particular, eles expressaram profundo ceticismo quanto
às opiniões de alguém que um
executivo do estúdio classificou
como "diplomata de médio escalão". As exibições que começaram
nesta semana em Washington e
Israel não atraíram comentários
oficiais palestinos.
Danoch, o emissário de Israel a
Hollywood, deixou claro que não
estava querendo comprar briga
com Spielberg ou tentando causar
controvérsia, e assim atrair ainda
mais interesse, para um filme definido como "obra-prima" em reportagem de capa da revista "Time".
Ele elogiou o filme, por exemplo, pelo retrato que faz quanto ao
horror do massacre, ainda que tenha dito que gostaria de que "Munique" mostrasse melhor a maneira pela qual os atletas assassinados se tornaram quase sagrados para os israelenses.
Danoch disse também que
Spielberg estava longe de ser a
única pessoa a reduzir o conflito a
um embate sangrento, mas equilibrado. No entanto, "no filme em
si", disse, "Israel uma vez mais é
retratado como se estivesse no
mesmo patamar dos palestinos".
"Não existe equivalência moral", acrescentou. "A tentativa de
obter um equilíbrio entre vítimas
do terror e seus algozes, a tentativa de balancear entre um governo
cuja missão é defender seu povo e
uma organização terrorista que o
mundo todo identifica como organização terrorista, equivale a
tratar a questão com leviandade."
Alegando que o filme não tinha
pretensões de precisão em termos
históricos, Danoch não quis dedicar muito tempo à contestação de
sua perspectiva. Apontou que o
roteiro, de Tony Kushner e Eric
Roth, se baseava em um livro,
"Vengeance" (vingança), de
George Jonas, que toma por fonte
o relato, posteriormente desacreditado, de um suposto membro
da equipe de ataque do Mossad,
Juval Aviv.
Danoch também reprovou a
descrição de "Munique", por
Spielberg, em entrevista à "Time"
como sua "oração pela paz".
Ele disse que a mensagem de
Steven Spielberg -a de que a paz
viria pela negociação e não pela
violência- não era exatamente
uma revelação. "Desde sempre,
Israel está tentando retornar à
mesa de negociações", afirmou.
"A maneira de fazê-lo, de acordo
com nosso plano de paz, é pôr fim
ao terrorismo."
Por fim, Danoch sugeriu que
tentar superar as divisões entre Israel e Palestina em um filme era
diferente para o cineasta daquilo
que aconteceu, digamos, quando
ele buscou revelar o horror do
Holocausto no filme "A Lista de
Schindler" (1993).
"A tentativa de sumarizar o
conflito por meio de algumas
poucas sentenças em um monólogo grandioso equivale a tratar
com leviandade um conflito que
custou tantas vidas e já dura tantos anos", afirmou Danoch. "É
uma presunção, mesmo que se
trate de Spielberg."
Tradução Paulo Migliacci
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