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POLÍTICA CULTURAL
Marcos Mendonça, secretário da Cultura de SP, deixa cargo dia 22 com orçamento comprometido
Fim de festa
France Presse
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Ensaio na Sala São Paulo, no dia de sua inauguração em 9/7/99, marco da gestão de Mendonça, que também foi foco de acusações |
FABIO CYPRIANO
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
O secretário de Estado da Cultura de São Paulo, Marcos Mendonça, 55, deixa seu cargo no próximo dia 22, a pedido do governador Geraldo Alckmin, para candidatar-se a deputado estadual.
Durante duas gestões consecutivas, portanto oito anos, Mendonça tornou-se um recorde em
permanência no cargo. "Não há
secretário que tenha ficado mais
de dois anos nessa função", afirma Mendonça.
Durante o período à frente da
pasta, Mendonça deixa como herança a Sala São Paulo e a Pinacoteca do Estado, que já se tornaram
cartão-postal da cidade. Mas também lhe valeram acusações por
usar uma empreiteira, a Construtécnica, que fez a maior doação à
campanha eleitoral do governador Mário Covas. A empresa continua realizando obras para a secretaria.
Por três horas, em dois momentos diferentes, Mendonça concedeu uma entrevista à Folha, em
seu gabinete, no mesmo edifício
onde funciona a pomposa Sala
São Paulo. Explicou que seu sucessor não vai poder fazer festa,
pois toda verba da secretaria para
2002 já está comprometida, e fez
um balanço de sua gestão. Leia a
seguir os melhores trechos.
Folha - O senhor foi acusado de
contratar uma empresa, a Construtécnica, que contribuiu com a
maior doação de campanha para a
eleição do governo Covas. Essa empresa continua envolvida com projetos da secretaria?
Marcos Mendonça - Essa polêmica foi um grande equívoco. Esqueceram de ver que obras como
a do teatro São Pedro e a do Arquivo do Estado haviam sido contratadas em gestões anteriores.
Essa é uma empresa que se especializou na questão do restauro.
Houve uma concorrência internacional para a Sala São Paulo.
Um grupo espanhol ganhou e depois contratou a Construtécnica
para executar alguns dos serviços.
Folha - A Construtécnica participa da reforma do Dops?
Mendonça - Sim.
Folha - Houve licitação?
Mendonça - Houve uma licitação. Hoje essa é a única empresa
no Brasil que tem requisitos, atestados e currículo para tal obra
com padrão internacional.
Folha - O que o sr. considera ter
sido o perfil de sua gestão cultural?
Mendonça - Definimos que iríamos trabalhar numa linha de excelência. A secretaria se propunha
a ser uma referência para o produtor cultural. Outra prioridade
era ampliar o acesso, democratizar a cultura no Estado, tentar espalhá-la o máximo possível para o
interior. Trabalhamos para usar a
cultura como um instrumento
para a revitalização do centro de
São Paulo e como um instrumento de transformação social.
Folha - No entanto, uma crítica
frequente à sua gestão é que houve
concentração de ações e investimentos na capital, em detrimento
do interior.
Mendonça - No interior, você faz
os projetos com as cidades. Ajudamos uma quantidade enorme
de cidades a fazer biblioteca, a fazer teatro. Evidentemente não são
equipamentos da dimensão de
uma Sala São Paulo, mas desenvolvemos projetos no interior de
importância brutal.
Folha - O orçamento de 2002, em
torno de R$ 80 milhões, é insuficiente para todas as ações empreendidas pela secretaria, o que
obriga à busca de novas fontes. O
que o sr. julga correto em termos
de alternativas orçamentárias para
a gestão pública da cultura?
Mendonça - Num país como o
Brasil, em que há necessidades
primárias fundamentais, você
tem sempre uma pequena dotação para a área da cultura. Por isso, defendo a necessidade de fontes alternativas para financiar a
cultura. A secretaria não tem de
ser uma operadora cultural, mas
uma fomentadora, tem que articular, dar mecanismos, fazer com
que o produtor cultural, o artista
possa desenvolver seu trabalho.
Esse é o papel fundamental da secretaria. Defendo ardorosamente
o incentivo fiscal à cultura. Fui autor de uma lei que criou esse mecanismo no município, porque o
incentivo fiscal não compete com
outras áreas para disputar mercado. Em São Paulo, o que pode ser
a grande alternativa, uma revolução para a questão cultural é a loteria da cultura.
Folha - Críticos ao modelo da gestão pelo incentivo fiscal apontam
como uma de suas precariedades o
fato de as decisões sobre o que produzir obedecerem exclusivamente
a critérios mercadológicos.
Mendonça - Na medida em que
você tem incentivo fiscal, você desonera o Estado de uma série de
compromissos que ele teria de assumir. Ou seja, permite que o Estado possa investir nesses setores
que não têm capacitação para
buscar recursos no mercado, por
serem projetos experimentais, de
vanguarda.
Folha - O projeto de transformar
os equipamentos culturais em organizações sociais, sendo portanto
geridos por entidades privadas,
responde a esse objetivo?
Mendonça - Entendo que é fundamental você ter, na área da cultura, um mecanismo que não seja
atrelado ao Estado, para que você
possa ter a captação de recursos
com mais facilidade, possa dar
um retorno de imagem com mais
facilidade, possa eventualmente
cobrar direito autoral, de imagem, de arena. A organização social tem uma flexibilidade própria
da iniciativa privada.
Dentro dessa estratégia, contratei a Fundação Getúlio Vargas,
que preparou todos os estudos, e
os estou encaminhando ao governador para que ele tome a decisão
da implantação ou não.
Folha - O sr. não teme que a administração desses equipamentos
culturais passe a adotar uma linha
excessivamente mercadológica?
Mendonça - Isso não me preocupa. Veja o que acontece com o Incor. O Incor nada mais é que uma
organização social que administra um equipamento do Estado,
que é aquele hospital que faz parte
do Hospital das Clínicas. Enfim,
há formas de captar recursos além
das formas normais e que apresentem um padrão de excelência.
Folha - Existe uma verba do orçamento não-comprometida para o
seu sucessor?
Mendonça - As verbas são todas
amarradas aos mais diversos departamentos. Cada departamento
tem a sua programação. O meu
sucessor vai estar com um orçamento já definido para as mais diversas áreas. Ele terá pouca mobilidade. Terá de cancelar um projeto se pretender criar algo novo.
Folha - Um ponto polêmico de sua
gestão é o projeto PIC-TV (Programa de Integração Cinema-TV). Por
que o programa acabou?
Mendonça - Esse é o modelo
mais adequado de cinema, o negócio mais inovador que se fez
neste país, tentando casar um canal de TV com a produção cinematográfica, em escala industrial.
Esse ano tivemos dois problemas.
A Fiesp havia se comprometido a
colocar outro tanto de recursos
além daquilo que o governo colocasse. E a Fiesp entendeu que não
seria possível captar esses recursos. Tínhamos também uma
perspectiva de ter recursos vindos
da privatização da Cesp. Como
não houve a privatização da Cesp,
não pudemos pegar esses recursos. Então, suspendemos o PIC-TV. Não quer dizer que ele tenha
acabado, mas, como não tenho
recursos, não vou deixar o sujeito
na fila com a expectativa de que
terá dinheiro.
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