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Patinho feio
Um dos poucos atores de sua geração a preferir o teatro à TV, Fernando Eiras, 52,
estreia "In on It" em SP
Lenise Pinheiro/Folha Imagem
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O ator Fernando Eiras pora no tatro Faap, em São Paulo, onde estreia "In on it" amanhã
LUCAS NEVES
DA REPORTAGEM LOCAL
Deve ser um cacoete assimilado pelo trabalho com a Cia.
dos Atores e seu jogo constante
de entrar e sair do personagem:
em 2h30 de conversa, o ator
Fernando Eiras, 52, troca de
pele a todo instante.
Esguio na poltrona do hall de
hotel, ele é o homem que repassa 35 anos de carreira em teatro, cinema e TV. Sabe que está
ali para falar da estreia da peça
"In on It" ("por dentro", em inglês), texto do canadense Daniel MacIvor em que contracena com Emílio de Mello, sob a
direção de Enrique Diaz.
Mas logo despe a persona pública, acomoda-se na ponta do
assento, avançando sobre o interlocutor, e tece comentários e
confidências que o Eiras "oficial" não se permitiria -tudo
soprado em murmúrios que
aquele não ouvirá.
Durante a conversa, quer ser
ele próprio e outros muitos.
Com a volúpia da fala, desafia o
outro a tomar as rédeas de seu
pensamento. "Tenho pavor do
ser humano, muita dificuldade
de aproximação. Se me deixarem, vivo num mundo só meu",
define-se, antes de baixar a
guarda e se espantar com a facilidade com que se deixa conhecer. "Dá vontade de ir ali tomar
um sorvete. (...) Só falta acender um baseado."
A certa altura, percebe: "Nem
entramos no "In on It", né?"
Ainda não. Antes, há que dizer que ele estreou num palco
aos nove anos, cantando "Menino Sol" diante dos 30 mil espectadores de um festival da
canção, no Maracanãzinho.
Criado nos saraus que congregavam a nata da música brasileira (o pai era compositor),
gravou três compactos na Philips e foi cortejado por Dalva de
Oliveira para um dueto no rádio, mas declinou:
"Era muito para mim. Ela era
um deus. [Quando disse não]
Minha mãe batia na porta do
quarto e gritava: "Fernando Antonio, você não é mais criança!"
Eu tinha dez anos", lembra.
"Tive de viver 40 anos para cantar com ela, mas só pude fazê-lo
sendo Francisco Alves [na minissérie "Dalva e Herivelto']."
Depois do baque, aos 13 anos,
Eiras trocou a música pelo teatro. "[Fazer uma peça] É lançar
uma ponte para o outro. Eu
precisava do outro. Não tinha
turma." Encontrou a sua no Tablado, escola de artes cênicas
da zona sul carioca onde se formaram muitos dos nomes mais
conhecidos da geração de Eiras.
Ao contrário de boa parte dela, entretanto, construiu uma
trajetória com muitos trabalhos no teatro e poucos na TV.
Louco no estúdio de TV
"Na televisão, você tem de
ser correto -e ser correto é o
fim da picada. Meus amigos que
passaram a vida lá dentro enferrujaram. Os diretores me
adoram, mas me acham estranhíssimo, pensam que posso
fazer loucuras no estúdio", observa, antes de se penitenciar,
reassumindo o Eiras apolíneo.
"Acho cafona falar mal da TV.
Preciso ganhar dinheiro, sou o
único da minha geração que
não comprou apartamento.
Um contrato de longa duração
me ajudaria a arrumar minha
vida, meus 60 anos."
No teatro, quem lhe deu prumo foram os atores e diretores
Rubens Corrêa e Ivan de Albuquerque, donos do teatro Ipanema, nos anos 80. Ali, teve aulas sobre dramaturgos, acompanhou leituras e ensaios, foi se
"tornando possível como ator",
como gosta de dizer.
Antes de conhecer, no fim da
década de 90, Enrique Diaz e
seu teatro da desconstrução,
cruzou com Brecht ("Mahagonny"), Molière ("George
Dandin") e Dostoiévski ("Ensaio Nº 4 - Os Possessos").
O Eiras moleque se insinuou
no crescido quando este soltou
a voz em musicais como "Nada
Além de uma Ilusão" e "A Noviça Rebelde". "A orquestra vibrando aos seus pés é algo dionisíaco. [Em "Noviça'] Me viciei
em Lexotan, porque ficava num
estado de excitação enorme."
No cinema, a parceria com o
diretor Júlio Bressane, autor de
ensaios audiovisuais que confiscam linearidade e sentidos
estanques, tem sido um refrão.
Já fez três fitas dele. "Ele roda
um filme para descobrir que filme quer", comenta o ator.
"E cadê "In on It'?", ainda
pergunta Eiras, quase no fim da
conversa. Ele mesmo responde: "Tudo isso é "In on It': o dentro da coisa, o fora, os dois ao
mesmo tempo."
Um homem sofre um acidente depois de descobrir estar
doente. Um ator e um ator/dramaturgo tentam achar o tom
para contar a história. "É um
quadro impressionista. De longe, você acha que vê algo. Ao se
aproximar, vê que não é nada
daquilo." Como Eiras.
IN ON IT
Quando: pré-estreia hoje (p/ convidados); sex., às 21h30, sáb., às 21h, e
dom., às 18h; até 28/3
Onde: teatro Faap (r. Alagoas, 903, Higienópolis, tel. 0/xx/11/3662-7233)
Quanto: de R$ 40 a R$ 50
Classificação: 16 anos
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