São Paulo, segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

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CRÍTICA JAZZ

Yusef Lateef cria de forma espontânea apresentação equilibrada e impactante

FABRICIO VIEIRA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A noite prometia ser de celebração. Não é sempre que se recebe um convidado como Yusef Lateef: 90 anos, sete décadas de música.
O começo foi silencioso, delicado, com Lateef sozinho ao piano. Aos poucos, cada músico foi adicionando seu toque, elevando gradualmente o tom e a intensidade, rumo a passagens de beleza e força agudas.
Sentado em uma cadeira durante boa parte da apresentação, o instrumentista mostrou ter muita disposição para fazer grande música.
Lateef deu maior atenção ao sax tenor e à flauta, mas visitou uma série de pequenos instrumentos de sopro de madeira que ficavam dispostos em uma bancada. E, para surpresa de muitos, pegou o microfone ao final para cantarolar "spirituals".
Sem resgatar standards -artifício característico do jazz mainstream-, o sexteto deixou o som fluir de forma ininterrupta por cerca de uma hora. Na realidade, a música feita por eles na noite de sábado, no Sesc Pompeia, nem deve ser rotulada, de forma estrita, de jazz.
O baixo mágico de William Parker, maior nome do instrumento na atualidade, foi um ponto luminoso da apresentação, criando camadas sensuais, dançantes e densas, pelas quais os outros instrumentistas passearam.
Rob Mazurek, responsável por agrupar o sexteto, conduziu o espetáculo com seu trompete elegante. Mauricio Takara (bateria) e Jason Adasiewicz (vibrafone), os mais jovens do grupo, exibiram criatividade e segurança.
Com coesão inabalável, o grupo construiu uma equilibrada malha polifônica, na qual todas as vozes desempenhavam papel de relevo: extrair uma delas criaria o risco de desequilibrar o todo.
Para quem não está acostumado a esse tipo de som, é difícil compreender que eles nunca haviam tocado juntos ou feito ensaios para o concerto. A música apresentada ali nasceu de forma espontânea, como ocorria com um quadro de Jackson Pollock.
Essa é uma das mais relevantes heranças do free jazz sessentista: mostrar que a grande música não demanda, obrigatoriamente, partitura e ensaios exaustivos. Da criatividade espontânea podem brotar peças de grande impacto estético e sensorial.

YUSEF LATEEF

AVALIAÇÃO ótimo


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