São Paulo, sábado, 14 de fevereiro de 1998

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Artistas segundo ele

da Reportagem Local

A seguir, José Ramos Tinhorão fala sobre nomes da música popular brasileira, ressaltando que "é absolutamente opinião pessoal, não como crítico". "Eu não falo mais de pessoas."
Carmen Miranda - Carmen foi uma inocente brasileira altamente criativa triturada pela indústria do show business americano, que pegou ela linda, nova e devolveu num caixão, inchada de injeção, de pílula para ficar esperta.
Silvio Caldas - Coitadinho... Ele entrou num time muito pesado, começou em 1929, antes de Orlando Silva. Era mulato simpático. Mas logo depois surgiu Orlando, que deu um banho nele.
Paulinho da Viola - Ele é brigado comigo (ri). Fiquei irritado quando gravou um samba do Nelson Cavaquinho, "Depois da Vida". O arranjo, cretino, parece barulho de móvel arrastando. Já sua gravação de "Pra Que Mentir" é um prodígio. Nem o próprio autor, Noel Rosa, conseguiu aquilo. Paulinho cantou, só com o violão, uma letra moderna, semelhante só às do Chico Buarque.
Chico Buarque - É um grande letrista. É a poesia do coloquial, ele faz o que Orestes Barbosa fazia, falar de apartamento, telefone. E com uma vantagem, não tinha o cacoete do cara que foi para a letra de música popular vindo de uma pretensão de poesia erudita.
Caetano Veloso - É um cara muito talentoso, inegavelmente. Dona Canô contou que viu ele falando, sozinho, olhando para as árvores, aos cinco anos: "Tudo isso aqui existe porque eu existo, fui eu que criei". Nele menino, já existia essa coisa de se achar predestinado. É megalômano, ele e o Millôr Fernandes. Mas é simpático. O artista tem que ser julgado pelo resultado, não vamos crucificar porque o cara é vaidoso.
Geraldo Vandré - É uma figura interessantíssima. Para mim, "Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores" é a única música de protesto feita no Brasil. Foi proibida, música de protesto que passa na Censura não é música de protesto.
Maria Bethânia - É cantora para palco. Aí, sim, tem um certo magnetismo pessoal. Quando o cara cantava na boca do microfone, só de pé, de terno, existia a canção, que dependia só da interpretação da voz. Hoje, ou você pula pelo palco como a... (gagueja) as meninas lá... a sirene do agreste (Elba Ramalho)... e a outra lá, a baiana, como é o nome? (Gal Costa), ou tem que ter uma luz caprichada, um jogo de cena. A Bethânia tem.
Elis Regina - Não acredito na emoção, que ela chorava quando cantava. Era lágrima de crocodilo. A natureza deu a ela uma qualidade de voz fantasticamente límpida, o resto era atriz.
Elza Soares - Ah! É uma caricatura, não é cantora americana nem brasileira, é um equívoco completo. Horrível, horrível, horrível. Horrível, que coisa horrível.
Wilson Simonal - Ah, fala de pessoas, né? Fala de gente.
Jorge Ben - É pura música de consumo, requentada. É aquilo, "chacatum", descobriu uma fórmula de não querer aprender tocar direito um instrumento.
Milton Nascimento - Ah, não. É outro blefe. É o homem das duas primeiras músicas. É "Morro Velho" e "Travessia" e acabou. Aquela coisa que as mulheres cantam (cantarola, sem letra, "Paula e Bebeto") qualquer um faz.
Clara Nunes - Ah, essa era uma oportunista completa. Levou um pau meu porque fez um disco que fotografou com umas coitadas dumas mulheres de terreiro. Você vai ver, pensa que é uma coisa nobre, uma cantora que tem trânsito na classe média cantando as coisas do povo. Só tinha música do marido e do Chico Buarque. Que é isso?
Zé Ramalho - É interessante, interessante. Gosto de caras um pouco fora de esquadro.
Itamar Assumpção - É comum. Ficam incensando um pouco. Talvez, como ele não teve oportunidade de despontar, haja um pouco de paternalismo. Não é ruim...
Chico César - Calhou bem para o momento dele, mas também não tem contribuição nenhuma. Essa coisa da "Mama África" é bem achada, fora de comum, mas não sei se vai ficar só nisso.



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