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CRÍTICA
Diretor enlaça histórias em filme de exuberância barroca
A atriz Suyane Moreira em cena do longa-metragem de Lírio Ferreira, que estréia hoje
Fotos Divulgação
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A atriz Suyane Moreira em cena do longa-metragem de Lírio Ferreira, que estréia hoje |
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
O cartão de visitas, Lírio
Ferreira entrega logo nas cenas de abertura: desfoques, uso
ousado de lente grande-angular,
um plano vertiginoso de Recife,
angulações inesperadas.
O que vem a seguir não desmente esse início vertiginoso. Estamos no território do barroco,
aonde nos leva já um roteiro com
várias histórias que parecem nascer umas das outras.
A primeira delas, central, diz
respeito a Jonas, homem do tempo de um canal de TV em São
Paulo, que precisa se deslocar a
Pernambuco para os funerais de
seu pai, assassinado, a quem não
via há milênios. De Recife ele viaja
para Rocha, no interior, onde sua
família o espera, enquanto prepara a vingança.
Em Recife, ele encontra um grupo de amigos "outsiders" que resolve fazer uma excursão até Rocha para acompanhar o amigo. A
viagem será acidentada.
A terceira história diz respeito
ao encontro de Rocha com a artista Soledad, que trabalha as relações decorrentes da seca na região. Podemos acrescentar a essas
uma quarta história, a da família
do assassino do pai, isto é, dos
descendentes de indígenas que
moram na região.
Com todos esses elementos
(que lembram essas teias ficcionais hiperbólicas em que é pródigo um Carlos Reichenbach) para
organizar num todo coerente, não
é de espantar que estejamos diante de um filme de exuberância
barroca, em que a luz é marcada
por contrastes radicais e a imagem, por panorâmicas de 360
graus, cenas inteiras compostas
em espelhos retrovisores, uma câmera que se posta ora lá em cima,
ora cá embaixo e que parece se
abrir a todas as influências do
mundo: Godard e Welles, Sergio
Leone e o faroeste, Glauber Rocha
e o cinema dito marginal.
Lírio Ferreira se entrega a sua
arte com paixão. Ele filma o agreste pernambucano como quem fizesse um faroeste. Mostra o sentimento de seus atores (Luiz Carlos
Vasconcelos e Aramis Trindade
em particular) ocultando-lhes os
olhos. Retrabalha o clichê das vinganças nordestinas até desfigurá-lo. Ele pinta as estradas secas do
Nordeste buscando o mesmo ânimo de Welles ao descrever a fronteira EUA/México.
Aos poucos, a gama de contrastes se alastra, ocupa o filme: branco e índio, interior e capital, seca e
água, misticismo e racionalidade,
Sudeste e Nordeste. É em meio a
essas tensões que "Árido Movie"
instala seu protagonista, que, com
justa razão, se vê perdido nesse espaço múltiplo, labiríntico, incompreensível, talvez absurdo em que
se dá esse drama do subdesenvolvimento cavalar.
Drama que, não sem ironia, o
filme vê se transformar, no Sul,
em exposição de arte, tutelada pela imagem de Meu Velho, o místico picareta. Sabemos então que
"Árido Movie" quer extrair dessa
paisagem e de seus personagens
uma imagem do Nordeste que seja verdade, não arte. Em poucas
palavras: esse primeiro vôo solo
de Ferreira é bem mais que animador.
Árido Movie
Direção: Lírio Ferreira
Produção: Brasil, 2005
Com: Guilherme Weber, Giulia Gam
Quando: a partir de hoje no Espaço
Unibanco e no HSBC Belas Artes
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