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LITERATURA
Jornal de Minas Gerais publica correspondência inédita entre o poeta e sua mãe, contrariando herdeiros
Drummond tem cartas divulgadas
CARLOS HENRIQUE SANTIAGO
da Agência Folha, em Belo Horizonte
A divulgação de cartas de Carlos
Drummond de Andrade a sua mãe
pode revelar um lado desconhecido do poeta, a dois meses do décimo aniversário de sua morte.
A publicação de trechos de sua
correspondência inédita, pelo jornal "Estado de Minas" no último
fim-de-semana, está contrariando
os herdeiros vivos do poeta.
Segundo um especialista na obra
do poeta ouvido pela Agência Folha, o lote mais importante da correspondência consiste em cerca de
120 cartas enviadas por Drummond, do Rio, para a sua mãe, em
Itabira (MG), após a morte do pai,
na década de 30.
A correspondência prossegue até
1948, quando sua mãe, Julieta Augusta, morreu.
Segundo o especialista -que
não quis se identificar, justificando que não quer se indispor com
os herdeiros-, a relação do poeta
com a mãe é quase desconhecida,
mostrando a pouca importância
da mulher na sociedade patriarcal
do interior de Minas.
"Drummond escreveu dezenas
de poesias sobre o pai, mas existem apenas umas quatro sobre a
mãe", diz o especialista.
Ele ressalta que foi nesse período
que Drummond se tornou um
grande poeta. "Nas últimas cartas,
ele já se desentendeu com o Partido Comunista e se voltou para a
família, o que resultou no lado memorialista de sua obra."
Para o professor de literatura
aposentado Antônio Sérgio Bueno, autor do livro "Modernismo
em Belo Horizonte", as cartas
mostram um lado humano do
poeta, "mais conhecido pelo seu
lado iconoclasta -do livro 'Alguma Coisa', por exemplo".
"Sou a favor da publicação, desde que não haja referências negativas a alguma pessoa viva", explica.
O tom geral das cartas à mãe, no
entanto, são bastante amenos.
Tratam de comunicados sobre a filha, Maria Julieta, ou acertam a
compra ou venda de bens.
Em outros momentos, ele pede
notícia de sua cidade natal, Itabira
(MG), ou envia um livro seu, pedindo desculpas antecipadas por
alguma "tolice".
"A questão do apego à família é
muito forte. Nas cartas, ele procura sempre agradar e faz concessões
à mãe", diz Bueno.
O advogado dos herdeiros, Henrique Gandelmann, afirma que a
divulgação das cartas não está autorizada pela família do poeta.
Segundo ele, os herdeiros não
vêem razão para que o seu conteúdo se torne público.
"Essas cartas não têm valor cultural. O único interesse que pode
haver na sua divulgação é o de tirar
benefício para vendê-las", afirma.
As cartas estão atualmente no
Instituto Cultural Brasil-Estados
Unidos, uma escola particular de
línguas em Lavras (261 km a sul de
Belo Horizonte), para onde foram
levadas pelo funcionário Eduardo
Cicarelli.
Além das cartas à mãe, seu acervo inclui fotos do poeta e cartas endereçadas ao irmão Flaviano, a
quem Drummond chamava de Vivi, e à cunhada Natália, chamada
carinhosamente nas cartas de Ita.
Cicarelli, que é colecionador de
selos, afirma que adquiriu o material há quatro anos, durante um
leilão informal entre filatelistas em
uma feira no Rio de Janeiro.
Otávia Miller, sobrinha-neta do
poeta, confirmou que as cartas são
autênticas e foram deixadas pela
mãe de Drummond, Julieta Augusta, após sua morte, com a sobrinha do poeta, Julieta Drummond Miller.
Segundo ela, Julieta Miller "dispôs das cartas há três anos", mas
não disse se o acervo foi vendido.
A reportagem da Agência Folha
apurou que o acervo valeria cerca
de R$ 50 mil e, caso seja publicado
em livro, esse valor cairia para R$
10 mil.
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