São Paulo, sexta-feira, 14 de junho de 2002

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CRÍTICA

Diretor vende o fascínio do adultério como crime

TIAGO MATA MACHADO
CRÍTICO DA FOLHA

Adrian Lyne ("Atração Fatal"), cineasta do adultério, não passa de um falso moralista. Por um lado, cultiva a sedução do adultério, explorando o charme e os dotes físicos de seus atores. Por outro, cultiva a culpa do adultério, jogando pesado com a consciência do espectador e com o destino de seus personagens.
Em "Infidelidade", disposto a engordar a sua conta bancária às custas da paranóia moralista americana, Lyne recorre à fórmula que o consagrou e que se tornou cânone dos thrillers erótico-televisivos: a fórmula do "adultério fatal". Filmes que seguem tal fórmula não fazem mais do que comparar o adultério ao crime, embora sejam sempre concebidos para vender ao grande público o fascínio de tal crime. Filmes como este não são mais do que a contínua proposta indecente.
Diane Lane é a dona de casa da família ideal de classe média. O casamento com o perfeito homem de negócios (Richard Gere) vive uma fase em que o apetite sexual dá lugar, no cotidiano, à sedimentação dos vínculos familiares.
Por um golpe do destino, Lane, cujas primeiras rugas estão longe de macular-lhe a beleza, conhece um jovem conquistador francês (Olivier Martinez), com o qual se vê tentada a se envolver.
Martinez é uma versão do velho Gere (o arrojado e infalível da juventude). O fato de seu personagem ter sotaque francês e ser um jovem colecionador de livros empresta um ar (pseudo)intelectual à sedução e serve para justificar o salário do diretor de arte do filme.
A sedução de Martinez se revela tão barata quanto a das imagens de Lyne (seus modorrentos planos de detalhe), mas é suficiente para convencer Lane a pular a cerca. Juntos, os amantes realizam todos os clichês de fantasia erótica que habitam o surrado imaginário da classe média americana.
O maridão, o Gere da maturidade, sereno e apaziguado, logo começa a coçar a cabeça. Assumidamente inspirado no Chabrol de "La Femme Infidèle" (1969), Lyne esboça um suspense em torno da desconfiança do marido. O processo serve antes para desvelar a hipocrisia do cineasta: enquanto Gere contabiliza as faltas de sua mulher, Lyne revela a índole (falso) moralista de sua história, restringindo-se a demonstrar o quão pouco funcional uma esposa adúltera pode tornar-se para família e sociedade americanas.


Infidelidade
Unfaithful  
Direção: Adrian Lyne
Produção: EUA, 2002
Com: Richard Gere, Diane Lane
Quando: a partir de hoje nos cines Belas Artes, Eldorado, Iguatemi e circuito



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