São Paulo, sábado, 14 de junho de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Crítica/"Lições de Roteiristas"

Lições de roteiristas não interessam só aos cinéfilos

DA REPORTAGEM LOCAL

Qual é a relação entre cinema e literatura? Até que ponto o roteirista é co-autor de um filme? São temas importantes em uma época em que roteiristas mostram cada vez mais poder na indústria audiovisual. E são assuntos cada vez mais relevantes para o Brasil, já que virou clichê dizer que "o roteiro" é o calcanhar-de-aquiles da produção brasileira (já teve época em que o vilão era "o som").
"Lições de Roteiristas" ajuda a ampliar um debate que deve interessar primeiro ao cinéfilo, mas não só a ele. Traz na forma de entrevistas a experiência de profissionais que rezam pela cartilha hollywoodiana, daqueles que são anti-Hollywood, e dos que souberam utilizar com inteligência a "ditadura do marketing" para expandir os limites do "mainstream".
As melhores entrevistas são de Ted Tally ("O Silêncio dos Inocentes") e Patrick McGrath ("Spider"). O primeiro, que veio do teatro, se adaptou às regras da indústria (dividir o filme em três partes, por exemplo) e trabalhou com um diretor habituado aos filmes de encomenda, mas com brilho próprio (Jonathan Demme). Ao seguir a cartilha, e em seguida subverter seus esquemas, a dupla conseguiu produzir um filme que mudou o conceito de thriller psicológico. McGrath, escritor sem nenhuma afinidade com o cinemão, consegue justificar porque só David Cronenberg poderia adaptar sua trama.
A dupla Robert Wade e Neal Purvis, ao narrarem a gênese de "007 - Um Novo Dia para Morrer", mostram (sem terem a intenção) por que as histórias de James Bond são tão ruins -apenas respeitam a fantasia de executivos.
Michael Haneke ("Código Desconhecido") mostra como uma educação longe da TV influenciou sua concepção de narrativa. Há também curioso depoimento do início da carreira de Wes Anderson, um dos mais criativos do cinema americano. Do francês François Ozon, uma estrela errática no cinema gaulês. E de Carlos Cuarón e Guillermo Arriaga, que invadiram a indústria americana pela fronteira mexicana.
Pesam contra essa edição um certo ar datado (é de 2004, mas a maioria dos filmes é dos anos 90), o deslumbramento do autor e uma opção de edição que, ao restringir as conversas a um único filme por entrevistado, evitou que estes se prolongassem em suas experiências.
Mais interessante seria o lançamento de "Screen Plays: How 25 Scripts Made It to a Theater Near You" (roteiros: como 25 deles conseguiram chegar a um cinema perto de você, HarperEntertainment, 352 págs., US$ 25,95, cerca de R$ 43), de David S. Cohen, que saiu nos EUA em fevereiro último -é mais atualizado, e tem abordagem mais criativa.
E há disponível no Brasil também clássicos do gênero, como o "Manual do Roteiro" (Objetiva), de Syd Field. Outra opção é "A Jornada do Escritor" (Nova Fronteira), de Christopher Vogler, que inter-relaciona arquétipos e mitologia com as narrativas contemporâneas -e extrai daí regras práticas para quem quer contar uma história, especialmente se ela durar duas horas e for contada numa sala de cinema. (MARCOS STRECKER)


LIÇÕES DE ROTEIRISTAS
Autor: Kevin Conroy Scott
Tradução: Beatriz Penna Vogel e Angélica Coutinho
Editora: Civilização Brasileira
Quanto: R$ 49 (392 págs.)
Avaliação: bom



Texto Anterior: Museu da Língua recebe 1º jornal
Próximo Texto: Literatura: Laurentino Gomes recebe prêmio da ABL
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.