São Paulo, Segunda-feira, 14 de Junho de 1999
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Decadência industrial revigora clássico

da Redação

A superação do setor industrial pelo de serviços e a perda de importância das linhas de montagem fizeram bem a "Tempos Modernos". Apontado como um dos maiores filmes de Charles Chaplin, sua cena mais elogiada mostra Carlitos incapaz de parar de repetir o gesto de apertar parafusos e sendo tragado por uma máquina.
Lançado em 1936, se transformou num ícone da crítica ao trabalho industrial. Com seu declínio, o filme e a cena-símbolo, que poderiam soar ultrapassados, podem ter outras qualidades valorizadas.
Dentre as características já elogiadas pela crítica, a que mais impressiona é a energia que desponta de uma aparente simplicidade.
O roteiro é trivial. O vagabundo e sua parceira órfã lutam para sobreviver numa sociedade marcada pelo desemprego. A evolução narrativa é mínima. Em busca de emprego, o atrapalhado Carlitos entra e sai da cadeia. As repetidas prisões (justas ou injustas) apenas confirmam seu desejo eternamente insatisfeito de adaptação social.
Enquadramentos e montagem seguem na mesma linha. Comparado a outros filmes da época, os cortes dentro das cenas são mais raros, numa estética próxima da dos anos 20, com a câmera ficando mais distante dos personagens.
O diretor fugia dos closes porque Carlitos era mudo. Com o rosto em destaque, ele teria de falar, o que só ocorreu em "O Grande Ditador" (1940). Em "Tempos Modernos", ele apenas canta em uma cena.

Visões opostas
O resultado é um cenário quase teatral, onde o espaço é construído exclusivamente em função do talento do ator. Essa opção gerou duas leituras opostas de sua contribuição para o cinema.
Para o russo Lev Kuleshov, ele seria, ao lado de D.W.Griffith, um dos maiores cineastas do mundo. E justamente por dar vida ao espaço, evitando sua transformação em fundo decorativo. Diferentemente de outros diretores, Chaplin usaria todos os objetos do cenário em sua interpretação, como na cena-símbolo. Outro exemplo vem na excelente cena do restaurante, onde até o lustre impede o esforçado garçom de cumprir sua tarefa.
Já para o francês Jean Epstein, "Chaplin não trouxe nada ao cinema, a não ser ele mesmo". Numa visão endossada por boa parte da crítica, seus elogios se concentravam na persona do vagabundo.
Com esse aproveitamento mínimo (e não simples) dos recursos do período, o que é incontestável, Chaplin repete em "Tempos Modernos" seu personagem de sempre, com pequenas variações.
O vagabundo (que não se cansa de procurar emprego) enfrenta com bom humor suas desventuras, rindo e fazendo rir de sua tragédia. Frágil na aparência, resiste à rejeição e sempre encontra força para seguir em frente. Mesmo sua suposta ingenuidade parece se desfazer ao final. Após vários fracassos, Chaplin convida sua parceira e o público a sorrir. Um sorriso de química estranha, carregado de esperança e melancolia. (JLF)


Avaliação:     


Título Original: Modern Times
Diretor: Charles Chaplin
Produção: EUA, 1936, 86 min
Com: Charles Chaplin e Paulette Godard


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