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Gramado avança rumo ao passado
Com prestígio em queda, festival gaúcho de cinema tenta recuperar sua influência com inovações no perfil da disputa
Evento inicia hoje sua 34ª edição com ficção e documentário colocados numa mesma categoria e reformulação do júri
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
O Festival de Gramado inaugura hoje sua 34ª edição com
mudanças no perfil da competição pelo troféu Kikito.
Documentários em longa-metragem e títulos de ficção
brasileiros agora formam uma
só categoria e disputam os mesmos prêmios.
É o fim da distinção que, na
antiga hierarquia do festival,
relegava os documentários ao
segundo plano e à chance de
um único troféu, o de melhor
filme do evento.
A partir deste ano, um autor
de documentário poderá sair
de Gramado levando o Kikito
de melhor direção, por exemplo (veja no quadro ao lado a
lista dos filmes competidores).
O festival mudou também a
composição de seus júris. Um
brasileiro preside a comissão
que avaliará os filmes latinos, e
um estrangeiro ocupa a presidência do júri que definirá os
vencedores nacionais.
O júri popular -cujo vencedor recebe premiação em dinheiro- é agora composto por
um número fixo de integrantes,
que terão o compromisso de assistir a todos os concorrentes.
Antes, o voto popular se baseava na reação aos filmes pelo público de suas respectivas sessões, sempre diverso.
A programação paralela à
disputa por prêmios ganhou
ênfase no debate de questões
atuais relacionadas ao mercado
de cinema. É uma tentativa de
dar ao festival o status de plataforma de tendências.
Em dois seminários distintos, os assuntos discutidos neste ano serão o lugar reservado
aos roteiristas na engenharia financeira dos filmes e o futuro
do mercado de DVDs -que já é
a ponta mais lucrativa da indústria cinematográfica em seu
principal mercado, os Estados
Unidos.
Roteiro
Já os roteiristas brasileiros
eram até há pouco tempo apontados como o elo frágil (em qualidade) da cadeia criativa. A indicação ao Oscar de Bráulio
Mantovani, por "Cidade de
Deus" (2002), marca a virada
da categoria, que quer ver seu
valor agora reconhecido também em cifrões.
Tanta novidade no festival,
no entanto, tem o objetivo de
fazê-lo voltar atrás -ao posto
de mais importante mostra de
cinema brasileiro, hoje ocupado pelo Festival de Brasília,
que, por sua vez, assiste ao
avanço em seus calcanhares da
Mostra de São Paulo e do Festival do Rio, ambos com programação internacional, mas cujas
franjas brasileiras crescem em
importância a cada ano.
Se é fato que a concorrência
aumentou, é certo também que
Gramado caiu sozinho. O festival se descaracterizou a partir
de 1992, quando a seca da produção nacional (subseqüente à
extinção da Embrafilme) levou
a mostra a abrir sua competição para filmes latinos, como
uma típica solução-tampão.
Desde então, à medida que a
produção nacional se revigora,
Gramado oscila entre enfatizar
a disputa nacional -ora de ficção, ora de documentários,
conforme esteja o vigor de cada
um- sem deixar de lançar mão
da "valorização" dos filmes latinos a cada entressafra local.
Celebrização
Com uma seleção de títulos
titubeante, o foco do festival
passou a ser a presença de estrelas globais (da TV, portanto). O desfile de celebridades é
constante em Gramado desde
sua primeira edição. Desacompanhado de bons filmes, no entanto, ele não faz mais do que
ressaltar sua inconsistência.
Os organizadores do festival
não falam abertamente em perda de rumo, mas traçaram o
plano de ajuste. "Pretendemos
em três anos fazer com que o
Festival de Cinema de Gramado tenha um formato mais definitivo e não mude de acordo
com a cinematografia brasileira, que num ano está bem, no
outro não está", diz Enoir Zorzanello, ocupante da presidência do festival até o mês passado, que deixou o cargo (por um
de conselheiro) à raiz de um
imbróglio burocrático envolvendo suspeitas de irregularidade em prestações de contas
anteriores da mostra.
Zorzanello foi substituído na
presidência do festival por Alemir Coletto, secretário de Turismo de Gramado, para cuja
economia o festival "tem uma
importância transcendental",
diz ele. Coletto quer que continue sendo assim. Por isso o
Festival de Gramado anda mudando, para ver se fica igual
-ao que já foi.
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